O colonialismo europeu e a visão que temos dele tem sido um dos temas mais fraturantes dos últimos anos na sociedade ocidental — com muitas pessoas, sejam académicos, ativistas ou meros cidadãos, a argumentar que a perspetiva eurocentrista que sempre tivemos pode ser errada e injusta tendo em conta tudo aquilo que aconteceu (e continua a acontecer, como consequência de atos passados).
Uma nova série documental da HBO, “Exterminate All the Brutes”, vem abordar este tema complexo. Tem quatro episódios e estreia esta quinta-feira, 8 de abril, na plataforma de streaming. Foi realizada pelo cineasta de 67 anos Raoul Peck, natural do Haiti, mais conhecido nos últimos anos por ter dirigido o muito aclamado documentário “I Am Not Your Negro”, a propósito da obra e perspetiva do escritor James Baldwin sobre o racismo nos EUA.
“Exterminate All the Brutes” não é uma série documental convencional. Tem um registo experimental, com uma vertente de ensaio, e Raoul Peck aparece como narrador. Apesar de ser ele o responsável pela produção, decidiu até partilhar os créditos da obra com académicos cujos argumentos defende e expõe nesta série, ainda que alguns deles já tenham morrido há vários anos.
O ator Josh Hartnett aparece em vários momentos para interpretar figuras que são uma espécie de alusão ao colonialismo violento. Ou seja, há partes que se desenrolam como cenas escritas, e há ainda excertos em animação.
Peck assume que este projeto é uma tentativa de chegar às origens da supremacia branca — e de perceber como esse sentimento de superioridade, e o histórico de violência das nações ocidentais, foi fulcral para atrocidades mais recentes da humanidade.
Por exemplo, argumenta que os séculos de colonialismo europeu em África, com múltiplos genocídios, estiveram na base para sustentar aquilo que depois Hitler quis fazer na Europa, com o Holocausto. E também fala do genocídio do Ruanda. Ao contrário de muitas produções do género com um ponto de vista americano — mesmo que afro-americano —, muitas vezes dotadas de um grande patriotismo, Raoul Peck também questiona e critica muitas coisas relacionadas com os EUA.
“Porque é que nunca foi chamado de crime de guerra?”, questiona o cineasta sobre as bombas atómicas lançadas pelos americanos na Segunda Guerra Mundial, que atingiram Nagasaki e Hiroshima, no Japão. Também aborda o genocídio dos povos índios pelos colonos europeus e, depois, pelas comunidades brancas americanas. E não tem pudor em refletir sobre a importância do dinheiro e do poder em muitos destes conflitos, questionando e apontando o dedo ao capitalismo americano.
O tom nunca é de individualizar as questões — não há tentativas de diabolizar líderes contemporâneos como Donald Trump, ou mesmo ditadores do século passado, como Hitler. O objetivo da série documental parece ser mais o de ajudar a explicar como é que estes líderes chegaram ao poder e foram legitimados no seu tempo.
E Peck argumenta que a humanidade está condenada a repetir a sua história de violência e de eleição de demagogos — tendo em conta que muitas vezes não a enfrentamos como deveríamos. Não só para assumirmos os erros dos nossos antepassados — a prioridade é apresentada, sobretudo, para aprendermos com os seus erros, e para não os voltarmos a repetir.
Por isso mesmo, de forma não cronológica, Raoul Peck vai relatando vários momentos da história do colonialismo desde os tempos das cruzadas — com uma perspetiva revisionista e crítica da visão eurocentrista.
Também é abordado, por exemplo, a forma como objetos icónicos da cultura pop — como certos filmes, que tanto se podem passar na guerra do Vietname ou no velho oeste americano — contribuem para glorificar momentos da história dos quais não nos devíamos orgulhar assim tanto. E argumenta que essas narrativas propagandísticas muitas vezes são nocivas para a sociedade em que vivemos.
Se quiser descobrir séries de ficção que estreiam na televisão (ou nas plataformas de streaming) durante este mês de abril, carregue na galeria.