Televisão

A guerra de bastidores que manchou “O Sexo e a Cidade”

O terceiro filme nunca foi feito e a minissérie que aí vem chega sem Kim Cattrall no elenco. Tudo por culpa de uma rivalidade.

Não havia mulher que não ficasse colada ao ecrã, fosse a suspirar pelos sapatos de Carrie Bradshaw ou a aplaudir mais um ataque certeiro de Samantha a um misógino. Quatro protagnistas fortes, com personalidades diferentes, captaram as atenções do mundo, sobretudo o feminino.

Os testes de personalidade nas revistas repetiam-se. “É mais Samantha ou mais Miranda?” O fenómeno tornou este grupo de amigas nas mais pretendidas estrelas da televisão. Quem é que não sonhava ter um quarteto de companheiras fiéis, engraçadas e cheias de estilo? A realidade talvez não fosse tão bela quanto a que aparecia no ecrã.

Na cerimónia dos Emmy de 2004, já depois da emissão dos derradeiros episódios de “O Sexo e a Cidade”, um pequeno pormenor despertou a atenção dos fãs. Na plateia, Cynthia Nixon, Kristin Davis e Sarah Jessica Parker estavam sentadas lado a lado. Longe, sentada à parte das colegas de elenco, estava Kim Cattrall. A distância não passou despercebida e acendeu os rumores de um conflito interno. E, de facto, havia.

Quinze anos depois, a separação é oficial. Depois da série e de dois filmes, “O Sexo e a Cidade” vai regressar para uma minissérie na HBO. No elenco estará novamente Parker, Davis e Nixon. Cattrall, segundo as mais recentes notícias, não está incluída.

A resposta esconde-se num segredo mais ou menos bem guardado pelas protagonistas ao longo dos anos. Um mal-estar indesmentível que, embora negado incessantemente, acabou por vir a público. Apesar de amigas na Nova Iorque fantasiosa da série, Carrie Bradshaw e Samantha Jones nunca mais partilharão cocktails — e a rivalidade de Jessica Parker e Cattrall tão pouco deverá ter um fim amigável.

O início da rivalidade

Quando a série foi lançada em 1998, a televisão parou para ver estas quatro mulheres. Cattrall era a mais famosa do grupo, embora a protagonista fosse claramente Jessica Parker.

De acordo com um livro de Clifford Streit, a inspiração real para a personagem Stanford Blatch, Cattrall “era uma comediante natural que roubava as cenas no melhor dos sentidos — a câmara gravitava naturalmente para ela”, relata o “New York Post”. Isso começou a desgastar os egos no set.

Todas as mulheres queriam ser como elas

Subitamente, grupos começaram a formar-se nos bastidores das gravações. Jessica Parker e Cynthia Nixon conheciam-se desde pequenas e agarraram Kristin Davis. Cattrall terá ficado sozinha, apenas com o apoio do produtor Darren Star, que acabaria por deixar a série na segunda temporada, substituído por um amigo de Parker, Michael Patrick King.

A rivalidade era de tal forma notória que durante uma semana de gravações fora de Nova Iorque, as três colegas alugaram uma casa só para si. Oficialmente, a HBO anunciou que Cattrall ficou sozinha numa casa porque era a única mulher casada. Na realidade, as diferenças entre atrizes era já quase irreconciliáveis.

Desde a segunda temporada que Parker não era só a atriz e protagonista, mas também produtora-executiva — o que se traduziu numa compensação extra de cerca de 300 mil euros por episódio.

Ao fim de seis anos, “O Sexo e a Cidade” aproximava-se do fim, entre dezenas de notícias que davam conta das tensões nos bastidores. Dizia-se que a atriz que fazia de Samantha teria sido a responsável por divulgar à imprensa um alegado aborto de Nixon.

Cattrall era oficialmente a outsider, afastada de tudo e de todos. “Nem o pessoal da maquilhagem lhe dirigia a palavra”, revelou uma fonte. 

Já depois do incidente na cerimónia dos Emmys de 2004, Cattrall abordou os rumores publicamente: “Somos as melhores amigas? Não. Somos atrizes profissionais. Temos as nossas vidas independentes.”

Cattrall foi afastada dos festejos nos Emmys de 2004

Só depois da emissão do último episódio é que a atriz se sentiu à vontade para falar sobre o fim da série e de como as exigências salariais das atrizes impediram a produção de uma sétima temporada.

“Senti que ao fim de seis anos, era tempo de todas nós participarmos nos lucros de ‘O Sexo e a Cidade’. Quando mostraram que não o pretendiam fazer, percebi que estava na altura de seguir para outras coisas”, revelou no programa “Friday Night with Jonathan Ross”. 

A paz podre

Quatro anos depois, o regresso improvável. Embora se soubesse que o clima era tenso nos bastidores, as atrizes tentaram sempre passar uma imagem de paz. E foi assim, de forma relutante, que Cattrall regressou ao grupo para gravar o filme lançado em 2008.

“O Sexo e a Cidade”, o filme, foi um sucesso de bilheteira estrondoso. Hollywood foi igual a si própria e começou a aquecer a máquina para uma sequela. Cattrall tornou-se novamente na pedra na engrenagem.
Fontes próximas da atriz revelaram à época que a relutância em regressar para um segundo filme se prendia novamente com a disparidade salarial entre Jessica Parker e as restantes protagonistas. Na imprensa, circulavam rumores de um “comportamento de diva” por parte de Cattrall.

O acordo acabaria por ser assinado e a sequela lançada em 2010. Só que por altura das gravações, Parker e Cattrall já não se falavam de todo, revelou a “New York Magazine” em 2009. “Isso pôs toda a gente no set extremamente desconfortável”, descreveram à época. 

Nas entrevistas, Sarah Jessica Parker acalmava os ânimos e garantia que não havia quaisquer conflitos internos. “Eu adoro a [Kim]. Não teria feito o filme sem ela”, revelou em 2009 à “Elle”.

Também Cattrall tentou desviar as atenções quando, em 2010, revelou que todo os rumores eram falsos. “Acho que a Sarah tem razão: as pessoas não querem acreditar que nós nos damos bem. Investiram demasiado na ideia de que estas duas mulheres fortes estão a lutar entre si. Torna tudo mais interessante”, explicou ao “The Daily Mail”

A tensão visível entre as duas nas gravações do filme

Seis anos depois, Hollywood estava pronta para voltar a atacar a mina de ouro de “O Sexo e a Cidade”. Com um argumento preparado, os rumores do regresso começaram a circular, até que Jessica Parker decidiu confirmar as intenções, mas ao mesmo tempo pôr fim à expectativa.

“É desapontante que não sejamos capazes de poder contar a história e viver esta experiência, ainda mais para os fãs que têm sido tão interventivos nos pedidos de um novo filme”, revelou em 2017. 

A manifestação de tristeza voltou a despertar os tablóides, que acabam por insinuar — citando fontes anónimas que alguns alegam terem tido origem no restante elenco — que a culpa é de Cattral e das suas “exigências desmedidas”.

“A única exigência que fiz foi que não queria fazer um terceiro filme. E isso foi em 2016”, respondeu de imediato Cattrall no Twitter. Voltou à carga em entrevista com Piers Morgan, onde refutou todas as acusações.

“Nunca pedi mais dinheiro. Nunca pedi outros projetos. Pensarem em mim como uma espécie de diva é absolutamente ridículo. Isto não tem nada a ver com dinheiro, com mais cenas, com nada disso. Esta é uma decisão muito clara, uma decisão que tomei sobre a minha vida, de terminar um capítulo e começar outro”, explicou.

Sobre Sarah Jessica Parker, foi rotundamente clara: “Nunca fomos amigas. Éramos colegas e creio que isso é saudável, porque tínhamos demarcadas muito claramente as linhas profissionais e pessoais”. E os problemas de bastidores? “[A Sarah] podia ter sido mais simpática”, rematou.

A luta pública

A confissão de Cattrall acendeu o rastilho que confirmou de vez os rumores que davam conta de uma rivalidade acesa entre si e Sarah Jessica Parker. Só que agora, a batalha havia deixado os corredores escuros dos bastidores e chegava às redes sociais que não existiam quando as quatro se tornaram nas amigas preferidas da televisão.

Confrontada com os comentários de Cattrall, Parker revelou estar “de coração partido”. “Foi tudo muito triste nessa semana. Não é dessa forma que eu recordo a nossa experiência. É muito triste, mas creio que aquela experiência única criou laços que nos vão sempre unir. Era uma experiência profissional que se tornou pessoal. Espero que isso eclipse muitas das coisas que foram ditas recentemente”, confessou.

Nesse mesmo ano, o irmão de Cattrall faleceu e nas redes sociais, a atriz agradeceu a todos os que haviam enviado mensagens de condolências. Entre elas estava Parker, que fez questão de deixar um comentário de apoio no Instagram da antiga colega. Fê-lo novamente na televisão, em duas ocasiões diferentes.

“Se alguém na tua vida, estejas ou não em contacto com ela, está a sofrer por alguma razão, é involuntário que queiras dar as condolências ou exprimir a tua tristeza ou simplesmente dizer-lhes que estás a pensar nela”, contou.

As mensagens não foram bem recebidas e as delicadezas foram definitivamente atiradas ao lixo. Cattrall nem esperou pela oportunidade certa. Pegou no telemóvel, abriu o Instagram e disparou sem piedade.

“A minha mãe perguntou-me hoje: ‘Quando é que aquela Jessica Parker, aquela hipócrita, te vai deixar em paz?’ A tua insistência em chegar a mim é uma dolorosa recordação do quão cruel tu eras e és. Deixa-me tornar isto muito claro, caso ainda não tenhas percebido. Tu não és da minha família. Tu não és minha amiga. Por isso escrevo-te uma última vez para que pares de explorar esta tragédia para fazer renascer a tua fama de miúda queridinha”, escreveu.

A mensagem esclareceu de vez todos os anos de confrontos escondidos em prol do sucesso dos diversos projetos. E perante esta derradeira confissão, Parker não teve outra saída senão dar a sua versão dos factos.

“Nunca respondi à conversa entre a Kim e o Piers Morgan, na qual ela diz coisas dolorosas sobre mim. Não consigo imaginar alguem que não a Kim naquele papel. Nunca houve nenhuma guerra; foi tudo fabricado porque eu nunca respondi. E não vou responder, porque ela disse o que tinha a dizer e esse é um direito seu.”

 

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