Televisão

O documentário hilariante (e original) da Netflix que conta a história da humanidade

“O Nosso Mundo, Segundo Philomena Cunk” tem cinco episódios. Uma apresentadora fictícia entrevista especialistas que não sabem o que os espera.
Diane Morgan é Philomena Cunk.

O cenário é convencional e ajusta-se a qualquer documentário produzido pela BBC. Imagens grandiosas de drone que mostram a apresentadora num local de rara beleza, entrevistas com historiadores ou cientistas sentados frente a frente em edifícios pomposos. Mas em “O Nosso Mundo, Segundo Philomena Cunk” não há nada de normal.

Nesta série documental de cinco episódios, produzida de facto pela BBC e que está na Netflix desde 31 de janeiro, a atriz Diane Morgan interpreta Philomena Cunk — que vai guiando os espectadores pela história da civilização e da humanidade, embora com um detalhe muito particular. Embora a trajetória geral seja precisa, nada aqui é para ser levado muito a sério.

“A invenção da escrita foi um desenvolvimento importante ou foi mais uma moda como o rap metal?” ou “O que é que foi culturalmente mais importante? O Renascimento ou a ‘Single Ladies’, da Beyoncé?” são perguntas que Diane Morgan, em personagem, coloca a especialistas e investigadores universitários de renome.

Os entrevistados ficam notoriamente constrangidos. Mas, seja com um maior ou menor grau de estupefação, tentam sempre responder às questões improváveis de Cunk — muitas vezes esforçando-se por lhe explicar coisas básicas, que todos damos por adquirido. 

Todo o texto é hilariante e acaba por satirizar os grandes temas do nosso mundo: desde a cultura à religião, passando pela sociedade de massas. Pelo meio há inúmeras tiradas que se calhar até convidam a alguma reflexão. Será que Jesus Cristo foi “a primeira celebridade vítima da cultura de cancelamento”? Há palavras que são intencionalmente mal pronunciadas, factos que evidentemente são errados, e uma ligeira obsessão por “Pump Up The Jam”, o famoso tema dos Technotronic.

A série documental tem sido um sucesso na Netflix e chegou nos últimos dias ao top 10 das tendências televisivas. A grande maioria dos espectadores está a descobrir Philomena Cunk pela primeira vez. Na verdade, a personagem celebra 10 anos em 2023.

Apareceu pela primeira vez em “Charlie Brooker’s Weekly Wipe”, um magazine de notícias satírico estreado na BBC em 2013 pelas mãos, claro, de Charlie Brooker — o criador de “Black Mirror”. A personagem começou por ser de classe alta, com uma grande falta de noção sobre a vida comum, mas ao longo de diversos projetos de Brooker foi-se tornando mais convencional neste aspeto — sobretudo quando Diane Morgan começou a usar mais o seu sotaque do norte de Inglaterra, não tão requintado.

Neste mais recente documentário, Cunk é vítima de várias teorias da conspiração que lê online. Por exemplo, tenta convencer um especialista de que, na verdade, os números só existem até ao 700. A partir daí só têm nomes diferentes para que as pessoas acreditem que continuam a subir. É tudo uma conspiração para controlar a humanidade. “Depois mando-lhe o vídeo no YouTube que explica tudo”, diz ao especialista.

“Isso é algo que me assusta na vida real. A confiança com que as pessoas dizem coisas só porque as leram algures”, explica Charlie Brooker, creditado como produtor e um dos argumentistas, em declarações ao “The New York Times”. A produção satiriza esta era da “pós-verdade”, mas acima de tudo tenta fazer comédia.

“Só quero fazer algo muito engraçado”, disse Diane Morgan ao mesmo jornal. “Para mim não tem de ter um grande significado. Não estou a tentar mudar o mundo, só quero que as pessoas gostem disto.” O grande segredo para o sucesso do formato, claro, é a forma como Diane Morgan diz o texto e nunca se desmancha — dizendo coisas absurdas de forma impávida e serena.

Não tem medo de fazer uma pausa extremamente constrangedora, e consegue dizer coisas ridículas com uma cara completamente séria. Para mim isso é mais assustador do que um bungee jump”, comentou Charlie Brooker com o “The New York Times”. “Muitas pessoas fantasiam com dizerem o que querem sem terem de se preocupar. Ela genuinamente não quer saber, e isso é quase um super poder.”

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