As duas temporadas de “Bridgerton” mantêm-se no top das mais vistas de sempre na Netflix, respetivamente, na quarta e sexta posição do ranking. Não será surpresa, portanto, que o spin-off chegado diretamente da Shondaland tenha saltado diretamente para o topo das mais vistas do momento.
“Rainha Carlota”, que estreou na Netflix na quinta-feira, 4 de maio, é a primeira filha de “Bridgerton” e centra-se precisamente nas origens de uma das personagens que mais marcou a produção de Shonda Rhimes. A desbocada rainha negra viaja no tempo até à época do início do seu reinado, algo que começa precisamente no casamento com o rei George III.
É India Amarteifio que assume o papel de protagonista ao lado de Corey Mylchreest, com Golda Rosheuvel a voltar ao papel de Carlota adulta. O elenco conta ainda com nomes como Arsema Thomas, Adjoa Andoh, Ruth Gemmell, Michelle Fairley, Sam Clemmet, Freddie Dennis e Rob Maloney.
Desta vez, Shonda Rhimes desempenha os cargos de showrunner e produtora — ao passo que “Bridgerton”, apesar de feita pela sua Shondaland, teve Rhimes apenas como produtora — e regressa às páginas dos livros de Julia Quinn, que servem de baste a todo este mundo. É novamente com a narração de Julie Andrews que somos relembrados que esta história é “ficção inspirada em factos”, ou seja, que Carlota é, na verdade, um espelho de Carlota de Mecklenburg-Strelitz, antiga esposa de George III.
É devido a um casamento arranjado que a alemã acaba por viajar até Inglaterra para conhecer George e, de forma inesperada, acaba por se apaixonar. A relação é o caminho que lhe permite conhecer melhor o monarca e, ao mesmo tempo, desvendar vários segredos.
A série tem sido bem recebida pelos críticos e conta com 93 por cento de nota no agregador de críticas Rotten Tomatoes. É descrita com uma série “divertida”, “sumptuosa” e “viciante”.
Embora seja, naturalmente, ficção, “Rainha Carlota” inspira-se numa figura controversa. Logo na primeira temporada, “Bridgerton” introduziu várias personagens negras em posições de relevo na sociedade britânica, numa altura onde se presumiria que estivesse povoada por homens e mulheres brancas.
De acordo com vários historiadores, à época, existiam, de facto, alguns nobres negros, embora a sua aceitação não fosse, nem de perto, tão alargada como a que é exibida na série. A exatidão histórica nunca foi o objetivo dos criadores de “Bridgerton”, que revelam a intenção de “criar um mundo que refletisse aquele em que hoje vivemos”. A trama inclui nobres e duques negros, sem que nunca as personagens debatam a questão da cor — à exceção do comentário acima.
O caso em questão: o da Rainha Carlota. A personagem inspira-se na figura real de Charlotte de Mecklenburg-Strelitz, que casou com George III para se tornar rainha de Inglaterra entre 1761 e 1818. A genética da aristocrata de ascendência germânica e filha de um duque de uma pequena cidade do norte da Alemanha sempre levantou muitas dúvidas.
O mito existe e permanece entre as comunidades negras, que sempre olharam com desconfiança para os retratos de Charlotte, cujos traços faciais aparentavam alguma mistura de raças. “Apontavam-se os traços fisiológicos que tão obviamente identificam a etnicidade desta jovem”, afirma o “Frontline”, programa de investigação da norte-americana “PBS”.
Sem fotografias e apenas com base em retratos — cujos pintores tendiam a embelezar e a suavizar as feições tidas como menos atraentes dos sujeitos —, os traços negros são mais aparentes nas pinturas de Sir Allan Ramsay, um intelectual que publicamente se opunha à escravatura.
De acordo com o historiador Mario de Valdes y Cocom, é possível traçar a ascendência de Charlotte até Margarida de Castro e Sousa, pertencente “ao ramo mestiço da Casa Real Portuguesa”. “Podem ser traçadas seis linhas diferentes entre a Rainha Charlotte e Margarida de Castro e Sousa, num património genético que por causa da consanguinidade era já minúsculo — que explica a inegável aparência africana da rainha”, explica.
A investigação publicada em 1990 estabeleceu, portanto, que “a rainha Charlotte é descendente direta de um filho ilegítimo de uma amante africana ligada à casa real portuguesa”.
Ao “The Washington Post”, o historiador americano revelou que esse filho teria nascido da relação ilegítima de Afonso III com a amante “Ouruana”, também conhecida como “Mourana” ou “Madragana”, supostamente uma muçulmana negra — um dado que ainda hoje é alvo de discussão.
Valdes remete outras suspeitas da etnicidade de Charlotte para o relato de um médico real, o Barão Christian Friedrich Stockmar, que terá descrito a rainha como “pequena e sinuosa, com uma verdadeira cara de mulata”. Um dos ministros terá dito que teria “um nariz demasiado largo e lábios demasiado grossos”. Várias menções são feitas ao seu aspeto físico, das feições à tez de pele mais escura e ao cabelo encaracolado.
“Muitos historiadores acreditam que Charlotte foi a primeira rainha mestiça. Isso de certa forma influenciou-me”, explica Chris van Dusen, o showrunner de “Bridgerton”. “Comecei a pensar como seria se tal acontecesse. O que poderia ter feito essa rainha? Poderia ter usado os seus poderes para elevar outras pessoas de cor na sociedade? Dar-lhes títulos?”
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