Esta segunda-feira, 5 de abril, abriram finalmente as esplanadas, viva! Por isso, fiz questão de ficar em casa a ver mais um episódio de “Cristina ComVida”, transmitido na TVI antes do Jornal da Noite. Uma semana depois, estava com curiosidade para ver se o Toy já tinha chegado com os frangos e se as minis ainda estavam no congelador. Depois de mais um episódio, devo dizer que estou com sentimentos mistos (soa mal, eu sei, mas mixed feelings também é piroso, por isso vai mesmo assim), sobre este programa.
Por um lado, é um talk show com todos os traços de um programa do género, mas, por outro, é uma coisa diferente. É quase como um anti-programa. Um dos trunfos de Cristina Ferreira — que explica bem o seu enorme sucesso — é o de transmitir a sensação de que não está a fazer um programa de televisão, está a conviver com pessoas. Com este cenário que simula uma casa — curiosamente a ex-casa do “Big Brother” — isso é elevado ao extremo, o que lhe dá contornos de reality show.
Cristina está num estúdio, mas sente-se em casa. E nós, em nossa casa, sentimo-nos também como seus convidados. Numa altura em que a televisão está carregada de apresentadores que nos querem impingir suplementos, dinheiro em cartão e encher chouriços intermináveis para nos tentar convencer a ligar para o 760 por apenas 25 euros por minuto, Cristina não está nem aí para o espectador e isso é algo que eu acho altamente relaxante.
A apresentadora sente-se tanto em casa que, depois de na estreia ter feito três maratonas em saltos altos, decidiu libertar-se da ditadura do general stiletto e passar a receber os seus convidados descalça. Uma atitude legítima mas arriscada, principalmente quando um dos convidados, o pastor Luís Camarada, leva para o jardim da casa três cabritas. Isto porque, cinco minutos depois, o relvado onde estava montado um piquenique transformou-se num campo de pequenas minas de esterco caprino.
O que vale é que Cristina, ao contrário de todos nós, tem em casa o auxílio de uma máquina de limpeza topo de gama, que se chama equipa de produção. A produção, que no que toca ao esmero do lar dá 10 a 0 a qualquer aspirador Rainbow, teve o cuidado de limpar as caganitas, não fossem os convidados pensar que se tratava de uma qualquer iguaria gourmet para acompanhar com as tostas e queijo do piquenique.
Além desta equipa, Cristina conta com o auxílio de Piedade, uma senhora que não é muito dada às limpezas e prefere azucrinar a cabeça da patroa, com a sua total falta de noção. “Oh Piedade, e o aspirador, quando é que sai do meu quarto!”, grita Cristina em desespero. Piedade é mais uma das várias personagens que Eduardo Madeira interpreta neste programa, e que comprovam o seu enorme talento como ator, humorista e improvisador.
Eduardo está em voo livre e parece ter carta branca para fazer o que bem entender — o que é raro em televisão — e isso faz com que muitas das suas tiradas sejam criadas no momento. Também isso ajuda a criar a tal sensação de espontaneidade que se estende aos próprios convidados. Esta segunda-feira o programa começou com Cristina a falar com Patricia da Silva, sobre como tirar nódoas de vinho tinto de toalhas brancas. Há coisa mais relaxante do que isto?
A especialista em truques do lar explicou que o melhor para remover este tipo de nódoas é despejar-lhe meia garrafa de vinho branco. Diz Patrícia que “vinho branco anula vinho tinto”. Será que anula mesmo? É que eu lembro-me dos meus jantares da faculdade, em que eu bebia um jarro de branco depois de ter bebido três de tinto e a única coisa que anulava era a minha capacidade para articular frases.
“Olha, e quando é sangue, como é que se tiram as nódoas?”, pergunta Cristina, num momento que me soou um pouco sinistro. Patrícia explicou que é com água oxigenada e rapidamente mudaram de assunto. Lá está, é o bom de ser um anti-programa. Se fosse um programa normal das tardes, depois disto entrava o Moita Flores a explicar quantos litros de sangue é que uma pessoa perde quando lhe arrancam as tripas com uma faca de cozinha.
Em vez disso entrou o virologista Pedro Simas, que é uma opção muito mais agradável. Pedro Simas caiu no caldeirão do otimismo quando era pequeno. Só pode, porque mesmo no pico da pandemia, a falar dos temas mais angustiantes, estava sempre feliz e de bem com a vida. Sempre super feliz, todos os dias, independentemente das circunstâncias. “Bom dia, Pedro, estás bom?” “Sim, estou ótimo, os meus pais acabaram de ser atropelados, vim agora do hospital, é a vida! E tu, meu querido, como é que tu estás? Quero ver esse sorriso!” Para quê ir para uma esplanada, quando podemos ficar a ver o Pedro Simas?