Antigamente, quando alguém se juntava para falar da vida de outras pessoas, normalmente estavam à porta de um prédio, com um balde e uma esfregona na mão. Hoje em dia estão num estúdio de televisão e chama-se a isto tertúlia cor-de-rosa. Ficamos todos a ganhar porque continuamos atualizados sobre a mais recente story da Sara Sampaio, sem ter de levar com o cheiro a Lixívia Domestos e o olhar reprovador da nossa porteira, por estarmos a pisar o patamar que tinha acabado de ser limpo.
O pináculo deste tipo de fórum é o programa “Passadeira Vermelha”, transmitido diariamente na SIC Caras. Com mais de mil emissões, o formato é um sucesso no que toca a dissecar o mundo encantado dos socialites, onde há reis, princesas e dragões — neste último caso, sempre que alguma revista publicava na capa uma fotografia da Duquesa de Alba.
Para fazer esta análise minuciosa aos principais temas do jet set, o programa conta com uma vasta equipa de comentadores, dos mais diversos backgrounds, além, claro, da eterna apresentadora Liliana Campos. Liliana é um disparate de elegância, está mais do que perfeita no papel de moderadora e faz-nos sentir como se estivéssemos na nossa sala de estar, se a nossa sala de estar fosse uma loja da Area.
A acompanhá-la está um grupo bastante heterogéneo que inclui nomes como Raquel Prates, Nuno Azinheira, Zé Lopes, Joana Latino, Filipa Torrinha Nunes, Mónica Sintra, Mariama Barbosa e Hugo Mendes. Ou seja, dá-me ideia de que os critérios de seleção para comentar na “Passadeira Vermelha” são tão rigorosos como os critérios de contratação de entregadores de panfletos publicitários.
“Tem dois olhos e uma boca? Está disponível a partir das dez da noite? Gosta de opinar sobre um vestido tigresse com a mesma complexidade com que o Nuno Rogeiro fala sobre a crise israelo-árabe? ‘Bora, está contratada. Só não peça é para mexer no ar condicionado, que o nosso técnico ainda hoje sofre de stress pós-traumático desde que levou com a ira do Cláudio Ramos.”
Gosto da dinâmica do painel de comentadores, porque por um lado temos a Mariama e a Joana, que dizem tudo o que lhes vem à cabeça e gostam de dar sermões aos visados, a olhar diretamente para a câmara, o que é delicioso.
Parece que consigo imaginar a Camilla Parker Bowles debaixo dos lençóis a chorar de cada vez que a Mariama diz que foi ela que destruiu o casamento do príncipe Carlos com a Lady Di. Por outro lado, temos uma abordagem mais ponderada com as intervenções de Nuno Azinheira e da psicóloga Filipa Torrinha Nunes, que tem um look giríssimo de atriz italiana dos anos 60 mas depois parece uma bibliotecária de 60 anos a falar.
Em todos os programas há pelo menos quatro assuntos que são invariavelmente tema de discussão: os looks dos famosos; as separações de casais; a realeza; e as declarações polémicas, que quase sempre são “bombásticas” e/ou “que não vai querer perder”.
Outra característica curiosa é que, para estes meios cor-de-rosa, tudo é bombástico e polémico, mesmo que na verdade não seja. Por exemplo, a Rita Pereira chega a uma pastelaria e pede um café cheio em chávena fria. Título das revistas: “Rita Pereira não faz por menos! Conheça as exigências extravagantes e a dieta polémica da atriz!” Se calhar esta é uma declaração bombástica mas aqui vai: parem de fazer isso, é ridículo e — tirando a Camilla Parker Bowles — já ninguém acredita nessas tretas.