Televisão
“Pesadelo na Cozinha”: o staff do Ninho de Sabores revoltou-se contra Ljubomir — mas a TVI não mostrou
O realizador do programa teve de prometer que desta vez iria censurar as asneiras do chef.

O restaurante completa um ano no dia 18.
Todas as semanas se repete o ritual: depois de provar os pratos, de gritar com os funcionários ou de consolar cozinheiras em pranto, Ljubomir Stanisic pega nos protagonistas do programa, leva-os para um cenário ao ar livre saído de um postal e tem conversas individuais que podem variar entre conselhos e puxões de orelhas. Em Braga foi mais (ou pior) do que isso. O chef terá sido tão agressivo com Bruno Martinho, proprietário de Ninho de Sabores, que a equipa do restaurante revoltou-se com a produção do programa da TVI e recusou-se a participar nas restantes gravações de “Pesadelo na Cozinha”, que foi transmitido este domingo, 4 de novembro.
“Ele [Stanisic] acusou-me de explorar a Susana [cozinheira] mas ela é minha sócia. Se assim é, ela também me explora, fazemos os mesmos horários. Obrigou-me a pedir desculpas e humilhou-me porque eu não estava a dizer as coisas como ele queria. A minha equipa não gostou”, queixa-se Bruno, de 40 anos, à NiT, referindo-se à agressividade com que, para ele, Ljubomir lhe falou.
Nesse dia, o dono do restaurante foi almoçar com os funcionários — como acontece, aliás, sempre — que lhe garantiram não querer sequer aparecer na manhã seguinte. Era o último dia, aquele em que o restaurante é reinaugurado e em que são apresentadas as alterações no espaço e na carta. A decisão foi comunicada à produtora Shine Iberia, que colocou a possibilidade real de não terminar este episódio. O realizador, Manuel Amaro da Costa, decidiu intervir para resolver um problema que podia ganhar uma dimensão embaraçosa para a TVI.
“Foi ele que pediu para falar comigo, o que acho que nunca aconteceu nos restaurantes anteriores, e estivemos a conversar umas duas horas e meia”, revela Bruno Martinho.
O tema principal foi a linguagem usada por Ljubomir Stanisic durante os quatro dias de outubro em que as câmaras estiveram ligadas. “Eu não sou capaz de dar um berro aos meus funcionários, por isso, não admito falta de educação em minha casa. Ele [o realizador] garantiu-me então que o palavreado agreste não iria passar.”
Manuel Amaro da Costa cumpriu e fez mais: as piores asneiras do chef jugoslavo foram substituídas por um sonoro “pi”. Uma tira vermelha cobriu-lhe também a boca, mas aqui apenas durante o teaser que passou na TVI para promover o programa.
Nessa atribulada e super tensa quinta-feira à noite, Bruno disse à sua equipa que no dia seguinte iria participar nas gravações porque “tinha um contrato assinado”, mas que não ia obrigá-los a fazer o mesmo. Os restantes quatro funcionários escolheram manter-se unidos e fazer o “Pesadelo na Cozinha” até ao fim. Contudo, acabou por ser Ljubomir Stanisic a abandonar o restaurante devido à frustração de falar e ninguém na cozinha olhar sequer para ele. Susana teve de ir atrás dele para que os convidados fossem servidos. Entre lágrimas e abraços, as coisas recompuseram-se a tempo.
A TVI contratou figurantes para encenar o serviço
Entre segunda-feira, 1, e sexta-feira, 5 de outubro, o Ninho de Sabores arranjou espaço para as câmaras, os cabos e as dezenas de pessoas da equipa de produção. Ljubomir Stanisic chegou na terça-feira, 2, para almoçar. Estava à mesa quando a luz foi abaixo — mas desta vez a culpa foi dos geradores da Shine Iberia e não do restaurante, como tinha acontecido umas semanas antes em Mangualde, no 2002.
Ainda assim, não foi nesse momento que se instalou o caos. As coisas começaram a correr mal ao jantar quando, de repente, se encheram seis ou sete mesas de clientes. Bruno suspeitou logo ali que alguma coisa se passava.
“Normalmente servimos três ou quatro mesas. Aqueles entraram todos ao mesmo tempo, não eram clientes habituais, e só pediam coisas feitas na hora, como francesinhas ou grelhados.”
Durante a noite só Bruno e Susana é que costumam trabalhar no Ninho de Sabores. Os clientes são poucos — mas há dois casais que todos os dias lá estão — e, quando é necessário, o proprietário pede reforço aos outros funcionários que moram nos prédios ao lado. Nessa terça-feira de gravações a produção não permitiu que isso acontecesse, garante Bruno à NiT.
“Queriam ver a realidade da casa, mas aquela não era a nossa forma de trabalhar, foi uma realidade induzida por eles.”
O número anormal de clientes naquela noite terá sido causado por um apelo feito pela Shine Iberia na Internet. “Andavam a contratar pessoas para fazer figuração num restaurante em Braga. Pagavam 15€ mais a refeição.”
Como é que Bruno sabe disto? Porque um dos inscritos era seu sobrinho que, ao ser contactado e perceber que o espaço em questão era o Ninho de Sabores, recusou participar na encenação.
Ljubomir não mexeu na carta
Ljubomir Stanisic achou que os pratos do Ninho de Sabores faziam sentido naquela zona e, apesar de ter deixado algumas sugestões diferentes na reinauguração, não mexeu na carta que já existia. “Aconselhou a rever os preços. A nossa diária custa agora 6€, em vez de 5,50€, e inclui pão, sopa, prato, café e bebida. Com seis ou sete restaurantes aqui ao pé de nós, não podíamos fazer muito mais”.
Oito pratos de carne e sete de peixe, aos quais são acrescentadas três sugestões do dia, ocupam uma folha A4. O design é recente, mas não foi deixado pela produção da Shine Iberia. Essa transformação é posterior à passagem da TVI por Braga e foi necessária para a atualização dos preços. Na cozinha ficaram as fichas técnicas nova,s mas das especialidades antigas. “A única coisa que muda é um pormenor ou outro, uma erva aromática talvez.”

A ilustração foi deixada pela produção.
Da metalurgia para a cozinha
A vida profissional de Bruno Martinho estava delineada há muito tempo. Trabalhava na fábrica metalúrgica dos pais, em Braga, e por lá teria ficado se a crise não tivesse chegado para lhes tirar clientes e lucros. Percebendo que em muitos meses não havia dinheiro para o ordenado dos pais, pegou em parte das poupanças e investiu num sonho que o perseguia desde o serviço militar, no final dos anos 90. O curso de cozinha que fez por lá foi posto em prática em 2014, quando abriu o Ninho de Sabores em Guimarães. Sim, Guimarães foi a primeira cidade escolhida depois de Bruno ouvir falar de um espaço que estava a vender o recheio. Custou-lhe 13 mil euros.
A ele juntou-se Susana, irmã da mulher. Vinha de um restaurante em Felgueiras e tinha perdido o marido há pouco tempo. A cozinha ficou por conta dela.
A mudança para Braga completa o primeiro ano a 18 de novembro. Tudo porque os sócios queriam estar mais perto de casa — é lá que vivem a mulher e os dois filhos do proprietário. Quando Bruno descobriu uma loja com licença para restauração, arrendou-a e gastou cinco mil euros em obras. Agora, diz, está prestes a comprá-la.
Bruno Martinho não se candidatou ao “Pesadelo na Cozinha” porque estava afundado em dívidas ou por não ser respeitado pela equipa. Aliás, nem sequer o fez para esta segunda temporada mas sim no início de 2017, antes da estreia do formato em Portugal. “Achei que seria um bom impulso para dar visibilidade ao negócio”, admite.
O contacto da Shine Iberia só surgiu um ano depois e, depois de várias fases, nem a produção tinha a certeza se o Ninho de Sabores seria um bom candidato. “Não cumpria os requisitos: tinha a casa limpa, tudo etiquetado, produtos de qualidade.”
Então qual será a justificação para a escolha? “Se calhar estavam com dificuldade em arranjar restaurantes maus que se sujeitassem a isto.”