Nadar 700 metros, seguidos de 20 quilómetros a pedalar e mais cinco a correr. Se já ficou quase sem fôlego só de imaginar uma prova normal de triatlo, quando se trata de uma competição IRONMAN, em que se percorrem longas distâncias, cada etapa é um teste à resistência física e mental.
O desafio não está ao alcance de qualquer um: implica percorrer 3,8 quilómetros a nadar, 180 de bicicleta e correr uma maratona, ou seja, 42 quilómetros. Como se consegue chegar a este nível? “Como em todos os desportos, com treino, consistência, disciplina e alguma organização”, confessa David Caldeirão, gestor de pessoas na Brisa.
Aos 51 anos, conseguiu classificar-se no IRONMAN Cascais, o ano passado, para a final do Campeonato do Mundo, que se realiza a 26 de outubro no Havai. E se os melhores conseguem terminar a prova em sete ou oito horas, a média dos participantes demora 12 a 16 horas a chegar à meta. Quando chegam.
À procura do “Santo Graal”
David não esconde o entusiasmo de quem está a poucos dias de participar na prova rainha da modalidade, na ilha onde foi criada, em 1978. Contudo, reconhece que “está na moda querer participar neste desafio”, onde só competem os melhores atletas do mundo. “Em vez de começarem pelas distâncias mais curtas, muitos passam as fases iniciais e avançam logo para o IRONMAN. É uma novidade, como acontece com as maratonas”, refere.
“Há pessoas que nunca correram na vida e que decidem fazer os 42 quilómetros, para os quais estão a treinar durante um ano. Acaba por ser esse o Santo Graal, é como atingir algo inimaginável. Está na moda.”
Além de David, este ano há mais 15 portugueses que conseguiram classificar-se para a final do Campeonato do Mundo: Rafael Delaunay Gomes, Mauro Azevedo, Lino Barruncho, Sérgio Costa, Marco Vieira, Jorge Vieira, Eduardo Mourato, Paulo Martins, Luís Nunes, Fernando Feijão, Fernando Carmo, Carlos Maia, Sérgio Marques, Francisco Salgado e Cláudio Macatrão.
“Durante vários anos, houve poucos atletas portugueses a participarem nesta prova, mas desde que chegou o IRONMAN chegou a Cascais começou a existir cada vez mais empenho e dedicação dos nossos atletas. Raro é o ano em que não se classificam entre 15 a 25 para o Havai.”
Como tudo começou
A aventura de David Caldeirão no triatlo começou há mais de três décadas, quando participou na primeira prova. “Já praticava atletismo, mas sentia que precisava de um desafio maior.” Aliou a natação e o ciclismo e nunca mais parou, até chegar ao IRONMAN. Tinha 35 anos quando concluiu a competição de estreia, com um tempo de nove horas e 18 minutos.
Desde então já participou em 17 provas de longa distância e, nos últimos 15 anos, tem feito “um por ano”, com 18 a 20 horas de treino por semana. Conseguiu a sua melhor classificação de sempre o ano passado, em Cascais: conquistou o quinto lugar e carimbou — pela primeira vez — o passaporte para o Havai, para onde parte com um único objetivo. Chegar ao fim.
“É óbvio que todos têm a expetativa de terminar bem classificados, mas estamos a falar dos melhores do mundo, numa prova única, em que tudo pode acontecer. Tenho esperança de ficar nos cinco primeiros, mas não é o meu objetivo principal. Esse é deixar o meu nome em como terminei a prova.”
A competição, onde se podem gastar cinco mil calorias e perder dois a três quilos em dez horas, implica superar vários desafios em termos de alimentação e hidratação. “Noutros tempos era mais difícil, mas hoje em dia temos géis, barras energéticas e líquidos isotónicos que nos ajudam a manter a energia e a estar o melhor possível. Costumamos dizer que, no IRONMAN a nutrição é a quarta modalidade porque é tão indispensável como nadar, pedalar ou correr bem.”
O segredo para conseguir competir num patamar tão elevado aos 51 anos? “A consistência e gostar do que se faz. Para mim, nadar, pedalar e correr são um modo de vida.”