“Todos os culturistas tomam esteroides. Ninguém é natural na competição — é quase impossível.” Diogo Rodrigues (nome fictício) tem 39 anos, é personal trainer e usa anabolizantes para conseguir chegar aos resultados que só com treino e alimentação não consegue. O personal trainer decidiu manter o anonimato, uma vez que se trata de substâncias ilegais em Portugal e ainda há “quem olhe para isto de forma pejorativa”, justifica.
Os anabolizantes são considerados demoníacos por quem não faz parte desta comunidade de atletas profissionais. Muitos, aliás, acabam por sofrer com os efeitos nefastos destes suplementos. Porém, Diogo garante que nunca lhe aconteceu “nada de grave”. “Quando comecei a tomar tinha 26 anos, era muito inocente, não sabia bem o que fazia. Agora, sou acompanhado por um médico e aquilo que sinto é que fico com mais energia, mais força, os meus músculos recuperam mais depressa e consigo obter resultados em menos tempo”, explica à NiT.
No entanto, não têm apenas vantagens — e Diogo não se esquece disso. “Nunca me aconteceu nada de especial, mas tenho mais queda de cabelo. Porém, faço uma fase de limpeza entre os ciclos para que os recetores comecem a trabalhar de forma mais natural.”
Com o uso contínuo os efeitos começam a diminuir, sublinha, porque o corpo “habitua-se”. Por isso mesmo, deixar de tomar também não é uma opção. “Quando parámos de injetar, em coisa de dias, o corpo fica mais flácido e depois de tanto esforço ver essa imagem ao espelho não é o que desejamos”, explica. E é isso que acaba por viciar. “Não há uma dependência nestas substâncias, mas no efeito que criam no corpo. É tudo psicológico.”
O personal trainer não descarta o esforço e o trabalho que põe no treino. “Os músculos que tenho não são só resultado dos esteroides que tomo, mas dos anos de exercício que levo e da alimentação regrada que faço.” No entanto, realça que, como faz competição, tudo conta.
Para percebermos como funciona o uso das drogas, Diogo explica-nos que normalmente prefere os anabolizantes injetáveis e planeia os ciclos para se adaptarem à fase de treino em que se encontra. “Numa fase de bulk [construção muscular] uso substâncias que tenham um efeito mais lento, que criem um maior volume. Se preciso de secar, prefiro os que têm uma ação mais rápido”, diz. Mas realça que “depende do metabolismo de cada um”.
Quando faz a aplicação garante que não sente nada, a não ser a “pica” da agulha. Mas tem sempre cuidado. “Não sou eu que me injeto, porque não tenho coragem e há sempre a cautela de usar seringas novas e desinfetar a zona. Normalmente prefiro injetar no glúteo, porque a absorção é melhor”, afirma.
A importância do acompanhamento médico
Diogo Rodrigues realça que é acompanhado por um profissional da área. António Santos (nome fícitio), especialista na área da performance desportiva sublinha que a vigilância médica é fundamental “para a saúde, segurança e desempenho de todos os atletas”. O médico preferiu manter o anonimato por se tratar de um tema controverso, que pode levar a interpretações erradas das funções de um clínico nestas áreas.
“O bodybuilding (fisioculturismo) é uma prática desportiva em franco crescimento em Portugal e a grande maioria inicia a prática sem qualquer vigilância médica prévia e posterior monitorização. Nós, médicos, podemos ajudar a otimizar o desempenho desportivo e garantir uma prática segura, saudável e com perspetivas de obter o máximo de performance desportiva possível sem riscos para a saúde”, explica o clínico. Mas, para isso, é necessário haver uma maior comunicação e menos julgamento.
“Ainda há muitas pessoas que olham para isto de forma negativa. E percebo. Isto não é, de todo, saudável, mas noutros países já é comum”, refere Diogo Rodrigues. Para António Santos o conhecimento médico na área dos anabolizantes também “é bastante reduzido em Portugal”, e, por isso, procurou formar-se internacionalmente porque, como atleta amador da modalidade, queria ajudar outros desportistas que precisem de mais informação sobre estas substâncias.
“Muitas vezes sou solicitado para consulta de atletas que fazem ou fizeram uso de anabolizantes. Umas das minhas obrigações é despertá-los para os riscos do uso”, avança o especialista na área da performance desportiva. Mas, mais do que isso, é na ajuda e não no “julgamento” que se caracteriza a verdadeira essência da arte médica: “quem me procura não pretende ser julgado, mas ajudado e, como médico, tenho o dever de minimizar dentro do possível, o risco da utilização”, conta à NiT.
O mercado dos anabolizantes
“É tudo underground”, diz o personal trainer. E explica: “Não existe na farmácia, nem nos supermercados, como vemos alguns suplementos”. Porém, há cada vez mais lojas online e nas redes sociais que vendem esteroides ilegais.
Diogo acredita que muitas vezes até já selecionam certos perfis de atletas para abordar. “Recebo, com grande frequência, mensagens no Instagram a perguntar se quero comprar que estão disponíveis para me ajudar, etc.”
No entanto, os ginásios continuam a ser o meio de excelência de venda deste tipo de produtos. “Os espaços de treino têm sempre alguém que usa anabolizantes e outros que vendem, ou conhecem alguém que o faça. Por isso acaba por ser um local de fácil acesso e, talvez mais seguro. Porque há também muita falsificação. É uma questão de sorte e de conhecimento”, refere.
Relativamente aos preços, o PT assume que atualmente “é mais barato”. “Um ciclo de testosterona e Deca [Decanoato de nandrolona], por exemplo, custa cerca de 70€, por mês”. Mas um nunca é suficiente. “Quem faz competição de culturismo precisa de algo contínuo e adaptado às diferentes fases de treino.”
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