“Faço isto pelo desafio, para demonstrar a mim próprio que sou capaz de tudo.” Pedro Vicente, 60 anos, nunca praticou desporto até aos 52, altura em que decidiu começar a correr. Desde 1 de outubro de 2020, tem corrido diariamente, acumulando um total de 1406 dias consecutivos, o que equivale a quase quatro anos.
Este músico e diretor comercial só começou a dedicar-se à prática desportiva em 2016, impulsionado por um desafio da namorada. “Ela mudou-se para Budapeste para trabalhar e deixou-me uma lista de sugestões, entre as quais se incluíam começar a praticar desporto, cozinhar e passar mais tempo com os meus filhos.” Inicialmente, a ideia de correr não lhe agradava, mas após muita persistência da parceira, decidiu experimentar. “Certo dia, consegui aguentar meia hora a correr. Senti-me um super-herói; naquela altura, parecia-me uma grande conquista e nunca imaginei ser capaz disso.”
À medida que as semanas foram passando, Pedro aumentou gradualmente o tempo de corrida. A namorada, já uma atleta, lançou-lhe o desafio de se inscrever numa corrida de 10 quilómetros em Budapeste. “Achei que estava louca; nunca pensei que conseguiria correr uma distância tão longa, mas aceitei. Em abril de 2016 participei na minha primeira corrida oficial.”
Após o regresso a Portugal, Pedro começou a inscrever-se em mais competições, e o seu gosto pela corrida foi crescendo. Estudou a modalidade a fundo e participou na sua primeira maratona em 2017, também em Budapeste. Desde então, já completou 70 meias maratonas, 50 maratonas e cerca de 400 provas oficiais.
“Enquanto investigava mais sobre corrida, deparei-me com pessoas que realizavam várias ultramaratonas por ano, e pensei que também poderia conseguir. Assim, decidi correr alguns dias consecutivos para ver como me sentia.” Após três dias, sentiu-se bem e decidiu continuar, acabando por estabelecer a rotina de correr diariamente há quase quatro anos.
“Descobri que a modalidade que pratico tem um nome: streak running.” Consiste em correr, pelo menos, 1,6 quilómetros diariamente. Quando atingiu 1000 dias, inscreveu-se no Streak Runners International, Inc., um site norte-americano que regista o percurso de cada atleta, onde é atualmente o único português.
O segredo da sua persistência é simples: “Nem sempre tenho vontade de correr, mas não quero desperdiçar o progresso que já alcancei. Até agora, nunca tive lesões, por isso quero aproveitar essa sorte”, revela. Em dias menos motivadores, Pedro “liga o piloto automático” e vai correr. “O que me interessa é a experiência e a vivência; não estou preocupado com a vitória. Sinto-me melhor agora do que aos 25 anos, estou a viver o período mais feliz da minha vida.”
Pedro participa maioritariamente em competições internacionais. “Aos sábados, apanho um voo, faço a maratona e regresso a casa a tempo de tomar banho”, brinca. Os destinos que já explorou incluem o deserto do Saara, na Tunísia (onde já esteve duas vezes), os EUA, Grécia, Helsínquia, Estocolmo e Turquia, entre muitos outros. Daqui a duas semanas, vai correr uma maratona na costa atlântica da Irlanda; em outubro, viajará até Antuérpia para uma corrida de 42 quilómetros; em dezembro, voa para Seattle (nos EUA), e em janeiro regressa ao deserto do Saara para uma prova de 110 quilómetros.
“Gosto muito destas viagens porque coleciono aventuras incríveis. Gravo sempre as corridas com uma GoPro, e tenho filmagens magníficas dos diversos lugares do mundo que já visitei.” Contudo, também já chegou a correr num aeroporto e a dar voltas em torno de um hotel para alcançar a distância mínima diária.
Tornar-se profissional nunca foi um objetivo, quando questionado sobre o dia em que terminará o desafio, a resposta é imediata: “Não tenho planos. Se pudesse correr para sempre, fá-lo-ia, mas sei que isso não é viável. O que me motiva é sair a correr esta noite; o amanhã é incerto.”
Treino e alimentação
O atleta é acompanhado por um treinador, que lhe envia um plano diferente todo os dias. “Faço treinos em escadas, em subidas, de fortalecimento muscular; a variedade é grande.”
Normalmente, opta por correr ao fim da tarde, com distâncias mínimas de 14 quilómetros. Pedro enfatiza que não corre apenas em terreno plano, pois é preciso estar preparado para diferentes desafios. “Vou três vezes por semana ao ginásio para fazer reforço muscular no tronco e nos braços, pois preciso descansar as pernas”, explica.
Relativamente à alimentação, a sua rotina é fácil de descrever: “saudável, mas não é demasiado restritiva”, sublinha.
“Se for jantar fora com amigos e servirem um cozido à portuguesa, como.” No dia a dia, evita carnes vermelhas e opta por alimentos como salmão, atum, ovos e massa, pois precisa de hidratos de carbono para manter a energia.
Outra curiosidade do seu regime é o facto de não tomar suplementos, pois considera que não são necessários. “Antes de uma prova, bebo um sumo de laranja, tomo um café e como um pão ou croissant com mel ou compota para obter açúcar”, descreve.