Ginásios e outdoor

“Situação vergonhosa” na Meia Maratona. “Uma cadeira de rodas não é um acessório”

Miguel Pinto, da dupla Iron Brother, explicou à NiT o que se passou na prova que aconteceu no passado domingo, 12 de março.
A prova tem 21 quilómetros.

No passado domingo, 12 de março, Lisboa encheu-se de fãs de corrida que estavam ansiosos por realizarem a EDP Meia Maratona de Lisboa, prova atravessa a icónica Ponte 25 de Abril. porém, nem todos puderam partilhar da mesma sensação.

“Hoje o impensável aconteceu”, começa por denunciar Miguel Pinto na página de Instagram que partilha com o irmão Pedro. Para continuar: “Quando as cadeiras da Associação de Paralisia Cerebral de Lisboa estavam a descer das carrinhas, para os utentes e voluntários participarem na Mini Maratona, como já é tradição da associação há mais de 20 anos, o diretor de prova, no local, deu indicação à PSP [Polícia de Segurança Pública] para o impedir, dizendo que estavam proibidas na prova. No século XXI isto é absolutamente inadmissível e é uma violação gritante do princípio da igualdade. É uma discriminação vergonhosa de pessoas com deficiência, quando andaram a publicitar a prova como inclusiva.”

A dupla Iron Brothers é composta por Miguel e pelo irmão Pedro que sofre de paralisia cerebral. Marcam  presença assídua neste tipo de provas, mas, por acaso, este ano Miguel estava a correr sozinho. “Só me apercebi do que se passava quando cheguei a Alcântara e vi os utentes da associação parados. No início até pensei que estavam ali para apoiar os colegas que vinham na corrida”, explica à NiT.

Quando se apercebeu da verdadeira razão ficou incrédulo. “Estavam todos devidamente inscritos, com dorsais. Tanto os atletas que estavam nas cadeiras de rodas, como quem ia empurrá-las”, esclarece. “Eles têm o direito de participar, nem é uma questão de ser uma prova inclusiva”, denuncia. E admite: “Foi uma situação muito triste e vergonhosa. Para os miúdos foi um choque e representa um grande retrocesso na luta pelos direitos da pessoa com deficiência.”

Segundo o regulamento que terá sido citado pelo responsável da organização que abordou os inscritos, “é expressamente proibida a participação de pessoas com animais de estimação, carrinho de bebé, patins, bem como qualquer outro acessório que não seja utilizado para este tipo de provas”, o que deixou todos os envolvidos mais incomodados. “A cadeira de rodas não é um simples acessório e, se eles acham que sim, é gravíssimo”, atira Miguel Pinto. E acrescenta: “Acho que não estavam à espera que alguém desse voz à situação”.

Para o atleta este caso mostra que ainda têm “muitos quilómetros para fazer” no caminho da inclusão. “Continuaremos a fazer o nosso trabalho e a nossa mensagem é sempre positiva. Queremos que as pessoas se inspirem e percebam que todos temos os mesmos direitos, sem condições”, refere.

Entretanto, a organização da EDP Meia Maratona divulgou um comunicado onde afirma que “a não participação de concorrentes em cadeiras de rodas, cadeiras de bebés e outros equipamentos nas provas deste domingo, se deve exclusivamente a questões de segurança e em consequência de incidentes graves ocorridos em edições anteriores”.

Miguel Pinto tem dificuldade em entender a justificação dada, uma vez que na edição do ano passado convidaram Eric Domingo Roldan, um maratonista amador espanhol que correu a empurrar a cadeira de rodas com a mãe, Sílvia, que tem esclerose múltipla. “E fizeram toda uma ação de marketing sobre esta participação”, atira.

Miguel e o irmão Pedro noutra prova.

“As regras foram comunicadas no regulamento das provas e na Sport Expo, que lamentamos se não estiveram claras o suficiente. Recordamos que enquanto organizadores de provas, fomos pioneiros na inclusão e, que entre 1998 e 2018, organizámos em Lisboa, em conjunto com a Meia Maratona, 20 edições da prova de deficientes motores em cadeiras de rodas com atletas semi-profissionais de todo o mundo”, acrescentaram os responsáveis pela prova.

O Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ) e o Instituto Nacional para a Reabilitação (INR) repudiam a exclusão de pessoas em cadeira de rodas da meia maratona e consideram que se trata de uma clara violação da lei da não discriminação e pede a devida punição nos termos previstos.

Já a Associação de Paralisia Cerebral de Lisboa reuniu com a organização da prova e depois de um pedido de desculpas, prontificou-se para os ajudarem a tirar dúvidas e oferecer ideias e sugestões para melhorar as condições, “para que isto nunca mais volte a acontecer”.

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