Ginásios e outdoor

Tomás prova que nem a paralisia cerebral o impede de realizar os seus sonhos

Com 75 por cento de incapacidade, o miúdo de 15 anos mostra diariamente que a sua condição só é limitante aos olhos dos outros.
Afonso nasceu às 25 semanas de gestação.

Tomás tem 15 anos e dois irmãos gémeos, o Afonso e Bernardo. Nasceram às 25 semanas, ou seja, prematuros extremos. Esta condição levou a que dois deles fossem diagnosticados com paralisia cerebral. Apesar das várias terapias e consultas, Tomás sempre se sentiu diferente e incapaz de fazer o mesmo que os outros miúdos. Tudo mudou com apenas um jogo de futebol.

“O Afonso tem tetraparesia, ou seja, é tetraplégico. O Tomás tem uma hemiparesia, o que se revela num problema com a coordenação motora no lado direito e um défice de atenção”, começa por explicar a mãe Andreia Rodrigues à NiT. Apesar de ter um grau de incapacidade de 75 por cento, a condição de Tomás não o impede de percorrer os seus sonhos.

“O Tomás é muito autónomo”, esclarece a progenitora. Estuda na mesma escola que o irmão Bernardo (que não apresenta sequelas da prematuridade) que escolheu a área de humanidades. Porém, Tomás preferiu dedicar-se a uma das coisas que mais gosta, os computadores. “Sempre adorou perceber como é estas máquinas funcionam e descodificar softwares, por isso, quando entrou no décimo ano decidiu seguir o curso profissional de informática”, conta.

Os interesses dos gémeos refletem os seus interesses individuais. “Cada um tem a sua personalidade e rotina, são pessoas completamente diferentes, com gostos muito distintos”. Porém, a relação entre os irmãos é forte e “muito bonita”. “Têm diferentes parâmetros de desenvolvimento, mas dão-se muito bem, apesar de haver dias e dias, como é comum entre irmãos”, ressalva a mãe.

Tomás compara-se muitas vezes aos irmãos. “Não tanto ao Bernardo, mas mais ao Afonso. Há dias em que me confessa que preferia ser como o irmão, porque não teria de enfrentar o estigma da sociedade, nem os olhares que o relembram que é diferente”, revela Andreia. E esclarece: “Isto porque o Afonso passa mais tempo em casa e também, devido à sua condição, não tem tanta noção do que se passa à sua volta”.

O Tomás tem limitações motoras e algum défice de atenção, mas um dos seus maiores obstáculos é a autoestima. “Acha sempre que os outros são melhores e que conseguem fazer melhor as coisas”, descreve. Além das sessões de fisioterapia, tem também consultas de psicologia, que o ajudam lidar com estes pensamentos. Porém, agora Tomás tem outra atividade que poderá ajudar ultrapassar estes problemas.

O sonho do futebol

O avô materno de Tomás era o presidente do clube de Santa Marta de Penaguião, a localidade onde vivem, até falecer, em maio deste ano. Como ainda tinha mais um ano de mandato, o pai de Tomás, Nuno Matos, assumiu o lugar do sogro. Como parte integrante da estrutura do clube a família passou a ir a assistir aos jogos de futebol. Durante uma das partidas, Bernardo disse aos pais que gostava muito de voltar a praticar a modalidade. Inspirado pelo irmão, Tomás pediu também para o inscreverem. Nuno Matos e a esposa Andreia conversaram com o treinador, que aceitou prontamente integrar os gémeos na equipa. Contudo, sublinharam que “não queriam que o mister se sentisse na obrigação de colocar o filho com paralisia cerebral a jogar”, simplesmente gostavam que este se integrasse no grupo.

Em setembro os irmãos começaram a treinar e os pais prepararam Tomás para a possibilidade de ficar várias vezes no banco, ou mesmo de não ser convocado. O adolescente aceitou bem os conselhos, mas garantiu que ia trabalhar como os outros miúdos para conseguir cumprir o seu sonho.

Depois de vários treinos e alguns jogos, a oportunidade de Tomás chegou. No passado domingo, 23 de outubro, foi chamado para entrar em campo. Aqueceu e fez a sua estreia. “Estava em êxtase, com a surpresa até foi aquecer com o casaco. Quando entrou em campo via-se a felicidade estampada no seu rosto”, conta a mãe à NiT.

O Tomás encontra-se no em baixo, do lado direito, junto ao treinador.

Porém, nem tudo foi fácil. “Quando entrou em campo, ouviram-se muitos comentários maldosos na bancada. Muitos questionaram o que é que o deficiente ia fazer”, lamenta Andreia Rodrigues. O miúdo jogou 10 minutos e ainda fez algumas exibições.

A euforia do Tomás era evidente, não só no final do jogo, como nos dias seguintes. “Nunca vi o meu filho tão feliz. Acordou sempre motivado para ir para a escola e para continuar a treinar. Aquele pequeno momento fez maravilhas pela autoestima do meu filho”, revela a progenitora.  São estas experiências que fazem tudo valer a pena, porque o dia a dia nem sempre é fácil.

“A logística de coordenar os horários das aulas, com as terapias é um pouco desafiante. Contudo, agora o Tomás passou a encará-las de outra forma. Diz que as idas à psicóloga e à fisioterapia são algo que tem em comum com os jogadores profissionais”.

A integração na equipa foi essencial para o Tomás. “Os colegas acolheram-no bem e incluíram-no em tudo. O treinador não o trata de forma distinta, o treino é igual para todos e isso deixa-o muito feliz, porque não gosta de se sentir diferente.”

Para os pais este foi um momento de orgulho não só por poderem provar o poder da inclusão, como também pela felicidade que viram, finalmente, no filho. “O Tomás provou que a sua paralisia não o limita e que consegue fazer tudo.”

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