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Saúde

Usam mais contracetivos, mas têm mais infeções. O que está a falhar na saúde sexual dos jovens?

O sexólogo Fernando Mesquita diz que a solução para o problema pode começar na “educação sexual nas escolas”. É importante fazer rastreios.

Os jovens portugueses são dos que mais usam métodos contracetivos na Europa, mas a incidência de infeções sexualmente transmissíveis (ISTs) tem vindo a aumentar. As informações são contraditórias e há razões que a explicam. “Têm informação, mas não têm literacia e educação sexual”, refere Fernando Mesquita, psicólogo clínico e sexólogo.

Grande parte dos jovens portugueses, cerca de 68 por cento, “estão a usar um método contracetivo ou pelo menos o seu parceiro está”, segundo o relatório do Fórum Parlamentar Europeu para os Direitos Sexuais e Reprodutivos (EPF), publicado em janeiro. Isso significa que Portugal é o segundo país europeu com resultado mais elevado, sendo ultrapassado apenas por Espanha (com 69 por cento).

No entanto, dados da Direção-Geral da Saúde (DGS), divulgados pelo semanário “Expresso” em março, mostram que a incidência de ISTs tem vindo a aumentar. Entre os 15 e os 24 anos, os dados mais recentes, relativos a 2023, mostram que foram registados mais de dois casos por dia de sífilis e gonorreia, num total de 866 casos de ambas doenças — quase 12 vezes mais do que em 2013. 

Fernando Mesquita diz que o uso mais generalizado de métodos contracetivos é uma “boa notícia”, mas admite que pode parecer estranho que as ISTs continuem a aumentar. “Por vezes, [os métodos contracetivos] são utilizados só no início das relações amorosas”, explica, mas “se as pessoas tiverem algum tipo de infeção, podem transmiti-la ao parceiro”, não importa quanto tempo passa.

Os métodos contracetivos mais usados pelos jovens portugueses são a pílula (47 por cento) e o preservativo masculino (42 por cento). Importa sublinhar que “o preservativo é o único método que permite alguma proteção relativamente às ISTs”, disse o sexólogo à NiT. A pílula protege apenas contra gravidezes indesejadas.

Outro lapso comum: “o preservativo é utilizado para a penetração vaginal”, mas é deixado de lado noutras práticas, “como o sexo oral ou sexo anal”. Quando isso acontece, “o risco continua a existir”. No caso de uma relação entre duas mulheres, pode utilizar-se o preservativo feminino, uma película ou um preservativo masculino cortado para evitar a transmissão de ISTs.

Quando questionado sobre soluções para a falta de literacia entre os jovens, Fernando Mesquita tem a primeira resposta na ponta da língua: “Educação sexual nas escolas”, “que cada vez mais se sabe que não é posta em prática”.

Deve evitar-se que “os jovens necessitem de recorrer à Internet para ter este tipo de informação”, o melhor é que seja passada por “pessoas realmente preparadas para lhes explicar”, refere o especialista. Fora da escola, é importante que tanto pais como profissionais de saúde que acompanhem os jovens tenham “abertura” para falar sobre o tema.

A Internet como fonte de informação

Segundo o relatório do EPF, que contou com 4201 respostas válidas, a principal fonte de informação sobre métodos contracetivos para os jovens é, como Fernando Mesquita previa, a Internet (30 por cento). Seguem-se os médicos de família (22 por cento) e ginecologistas (15 por cento) e a escola (15 por cento).

Além da possibilidade de não fazer uma interpretação correta de informações online (ou de cair em desinformação), a pornografia, que muitos jovens veem, pode induzir em erro sobre práticas corretas. “Cada vez mais os conteúdos pornográficos são de acesso mais fácil e ilimitado […] e não são conhecidos pela boa informação sexual”, repara Fernando Mesquita.

Não há muitas pesquisas sobre a exposição de jovens a pornografia em Portugal, mas um estudo de 2019 da Rede de Investigação EU Kids Online, concluiu que 37 por cento dos jovens entre os nove e os 17 anos já tinha visto imagens de cariz sexual no ano anterior. E 42 por cento revelavam que era uma prática semanal.

“Raramente — diria que quase nunca — existe o uso de preservativo neste tipo de conteúdos”, afirma o sexólogo. Pôr imagens da colocação de preservativos em vídeos pornográficos “podia ser uma forma de educar”, admite Fernando Mesquita. Não resolve o problema a fundo, mas pode ter efeitos positivos.

Além disso, a incidência mais elevada entre os jovens pode ter outra explicação: “a juventude é caracterizada pela sensação de que nada lhes acontece, são imortais, têm muito tempo pela frente e as coisas más só acontecem aos outros”, e por isso não procuram saber como podem estar mais protegidos. A comunicação com os parceiros também pode não ser a melhor — é importante “sabermos os nosso limites, o que queremos e não queremos e aprender a dizer não”, sublinha o psicólogo, em conversa com a NiT. É que muitas vezes, “quando não há educação”, um jovem pode pressionar outro a não utilizar métodos contracetivos.

Para uma pessoa que tenha vários parceiros, o melhor é “fazer um rastreio de seis em seis meses”, aconselha Fernando Mesquita. E, claro, estar atento a quaisquer sintomas, especialmente se tiver ocorrido algum comportamento de risco. No caso da sífilis, os sintomas iniciais costumam ser o aparecimento de uma ferida indolor no local da infeção, seguida de manchas vermelhas na pele, febre e outros sintomas gripais. A gonorreia caracteriza-se, em mulheres, por dor ou ardor ao urinar, corrimento amarelado ou esverdeado, e, em homens, inchaço e dor nos testículos.

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