Após concluir o ensino secundário, Francisco Rodrigues, de 19 anos, decidiu fazer um ano sabático. A intenção era embarcar numa viagem de mochila às costas por vários países, enquanto decidia o rumo que queria seguir na universidade. No entanto, a aventura foi abruptamente interrompida quando chegou à Eslovénia.
“Quando terminei o 12.º ano, percebi que era a altura ideal da minha vida para fazer uma pausa. Não tinha grandes responsabilidades, por isso, organizei uma viagem a solo. Antes, trabalhei em vários sítios para juntar o dinheiro”, conta o jovem natural de Sesimbra, à NiT.
A sua jornada começou na primavera de 2023, começando pelos primeiros três meses na Ásia, visitando países como o Vietname e o Japão. Mais tarde, fez um interrail, passando pela República Checa, Áustria e Eslovénia.
O dia 24 de junho marcaria uma reviravolta na sua vida, enquanto se encontrava na Eslovénia com pessoas que conhecera durante a viagem. “Combinámos ir fazer um passeio noturno. Era verão, estava calor, e alguém sugeriu que déssemos um mergulho no lago. Pensei que a profundidade fosse suficiente e, por isso, mergulhei de cabeça. Quando entrei na água, fiquei paralisado e quase me afoguei porque estava de barriga para baixo.”
O acidente poderia ter custado-lhe a vida, se as pessoas com quem estava não tivessem percebido o que se passava. Em pouco tempo, conseguiram trazê-lo de volta à superfície, levando-o para a margem e chamando os serviços de emergência.
No instante do acidente, Francisco sentiu imediatamente que algo estava errado. “Cresci numa zona costeira e as histórias de pessoas que ficaram sem andar após saltos para a água que correram mal são frequentes.”
Ao chegar ao hospital, foi submetido a exames que revelaram duas vértebras fraturadas. Após uma cirurgia de urgência para lhe estabilizarem a coluna, recebeu o temido diagnóstico. “Já suspeitava que estava tetraplégico, porque não sentia nada do pescoço para baixo, mas ouvir aquilo foi aterrador“, recorda.
A milhares de quilómetros, o pai, João Rodrigues, foi avisado do que se passava pelas pessoas que acompanhavam o filho. No dia seguinte, apanhou um voo para a Eslovénia. “Fiquei desesperado. Quando me contactaram não me deram muita informação, por isso, não tinha percebido a gravidade da situação. Antes do Francisco ser operado ainda consegui falar com ele, mas só quando lá cheguei e falei com os médicos é que soube de tudo”, explica João.
A primeira semana de internamento foi passada em coma. “Não tenho muitas recordações desse período. Recebia muita medicação e não conseguia discernir entre o que era sonho e o que era realidade. Nunca estive 100 por cento consciente enquanto estive lá”, revela Francisco.
Uma semana após o acidente, conseguiu regressar a Portugal, onde ficou internado no Hospital Garcia da Horta durante os nove meses seguintes. “Quando cheguei, voltei a entrar em coma devido a duas paragens cardíacas. Nesse período, não tinha memória do acidente e não conseguia entender por que estava numa cama sem me conseguir mexer”, detalha o jovem.
Só um mês depois é que começou a tomar plena consciência do seu estado. O longo período que esteve inconsciente levou à necessidade de entubação e, posteriormente, foi-lhe realizada uma traqueostomia, que implica a criação de um pequeno orifício na garganta para facilitar a respiração. “Nessa altura, não conseguia falar. Demorou mais de um mês até recuperar a voz e, atualmente, continuo em fase de recuperação da minha garganta.”
O processo de reabilitação de Francisco não começou de imediato, pois o seu organismo necessitava de tempo para se recuperar do choque. Contudo, gradualmente, foram introduzidas sessões diárias de exercício.
A transferência para o Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão foi um ponto de viragem para a conquista de mais mobilidade. “Recebo acompanhamento de uma fisioterapeuta que tem uma filha na mesma condição que eu. Ela tem sido uma grande ajuda, não só nas sessões de fisioterapia como também com conselhos úteis para o dia a dia”, sublinha.
Francisco destaca que, desde o início da sua reabilitação, há sete meses, não parou de progredir. “Quando cheguei, não tinha cadeira de rodas elétrica, e agora consigo andar numa cadeira movida a braços.” As sessões de fisioterapia ocupam-lhe cinco dias da semana, e aos fins de semana trabalha de forma independente em casa. Para ele, a motivação surge dos progressos que observa no seu corpo, sempre que realiza movimentos que há quatro meses eram impossíveis.
No passado dia 1 de setembro, Francisco partilhou a sua história nas redes sociais e lançou uma campanha de angariação de fundos na plataforma GoFundMe, para conseguir adaptar a sua casa à sua nova condição, e comprar uma cadeira de rodas e uma cama articulada. “Não esperava tal repercussão. Sou bastante cético e costumo pensar que as coisas não correrão bem. Fiquei atónito com a quantidade de partilhas”, afirma.
Os seus objetivos são manter a rotina de exercícios diários para alcançar cada vez mais independência. “Não me foco demasiado no que posso alcançar. Qualquer melhoria é um ganho.”
A passada terça-feira, 10 de setembro, representou outro marco importante para Francisco: começou as aulas da licenciatura em Engenharia Física, na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa.
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