Saúde

Cientistas portugueses recebem mensagens agressivas quando falam sobre a Covid-19

Defender a vacinação, propor confinamentos e explicar os perigos do vírus geram ameaças de morte e insultos a especialistas.
Fenómeno contra estes profissionais ocorre em todo o mundo.

Após tomarem posições públicas sobre a Covid-19 vários especialistas  têm recebido todo o tipo de recados agressivos. Este um fenómeno mundial contra cientistas, do qual Portugal não fica de fora, é descrito numa reportagem da CNN Portugal, publicada nesta terça-feira, 4 de janeiro.

“Mereces uma tareia”, “serás julgado”, “és um nazi”, “sei onde moras” e “cuidado com os teus filhos” são alguns dos exemplos das intimidações e insultos partilhados com o canal de notícias por seis profissionais.

Defender a vacinação, sobretudo nas crianças, propor confinamentos e explicar os perigos do SarsCov-2 estão entre os temas que costumam provocar reações, através de mensagens nas redes sociais. Muitas vezes, falar sobre a pandemia traduz-se, igualmente, em queixas nos empregos.

“Mereces levar uma telega (tareia) à antiga”, “Se um dia estiveres por perto vais receber o tratamento que mereces”, “Sabes o teu destino não sabes?”. Os avisos ameaçadores ao pneumologista Filipe Froes multiplicavam-se, principalmente quando começou a falar sobre o processo de vacinação, contou.

Apesar de continuar a aparecer na comunicação social, o consultor da direção-geral de Saúde e coordenador do gabinete de crise para a Covid-19 da Ordem dos Médicos viu-se obrigado a adotar medidas preventivas. “Tomei precauções no sentido de garantir mais segurança”, admitiu. Não só deixou de ir a certos sítios como evitou deslocar-se a locais que não conhecia bem.

O imunologista Luís Graça, pintou o mesmo cenário. “Recebi ameaças e insultos, algumas por mensagens privadas nas redes sociais”, conta. O motivo? Ter explicado publicamente o parecer da Comissão Técnica de Vacinação da Direção-geral de Saúde (DGS), da qual é membro, revelando que existiam mais benefícios do que riscos em vacinar as crianças. Além da integridade física do próprio, a da sua família foi posta em causa. O profissional chegou também a alterar rotinas.

Uma realidade idêntica foi vivida por Tiago Correia, investigador do Instituto de Higiene e Medicina Tropical da Universidade Nova. “Ameaçaram-me fisicamente, diziam-me que sabiam onde moro e que, como tenho filhos, devia passar a ter cuidado com aquilo que digo”, revelou à CNN Portugal. Com tudo isto, o especialista sentiu a necessidade de repensar cada momento em que aparecia publicamente para falar sobre a pandemia, medindo o custo-benefício e rejeitando sempre “comentar coisas sem fundamento científico”.

Já João Júlio Cerqueira, médico especialista em Medicina Geral e Familiar, foi alvo de várias queixas, entretanto arquivadas, da Ordem dos Médicos. Resultaram, na maioria, de ter “denunciado que suplementos à saúde não eram eficazes contra a Covid-19”, relatou.

Por último, o médico intensivista Gustavo Carona contou à estação ter sido comparado aos nazis, “só por ter dito que os não-vacinados transmitem mais, adoecem mais e morrem mais”.

Pelo mundo, destacam-se casos como o de Anthony Fauci, conselheiro principal de saúde da Casa Branca. Após receber ameaças de morte, o profissional precisou recorrer a segurança privada. Christian Drosten, virologista alemão, recebeu por correio um frasco com um líquido assinalado como “positivo”; e o belga Marc Van Ranstand teve mesmo de se esconder com a família numa casa segura, depois de um atirador militar ter fugido do exército e deixado uma nota a dizer que tinha os virologistas como alvo.

Um artigo publicado em outubro na revista científica Nature, realizado a partir de um inquérito feito a 321 investigadores que deram entrevistas sobre a Covid-19, revelou que 15 por cento dizem ter recebido ameaças de morte e 22 por cento vivenciaram ameaças físicas e de ordem sexual.

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