Saúde

Luísa e o burnout. “Quando cheguei às 12, mas só entrava às 18 percebi que estava mal”

A jornalista de 28 anos revelou à NiT os motivos que a levaram a deixar a SIC e a comprar um bilhete para a Suécia só de ida.

“Nada fazia sentido, havia algo dentro de mim que me dizia que não era normal.” Luísa Correia, 28 anos, trabalhava na SIC Notícias quando começou a perceber sintomas que sinalizavam algo errado na sua saúde. “Experimentei picos de febre. Acordava num dia completamente exausta e, no dia seguinte, sentia-me ótima”, começa por explicar à NiT a jovem, natural de Matosinhos.

Durante o ensino secundário, em Matosinhos, Luísa pensava ter certezas sobre a carreira que desejava seguir, mas os planos mudaram. “Passei por uma típica crise de adolescência que me deixou inquieta e desencadeou um breve estado depressivo. Deixei de saber o que realmente queria. Nesse ano, alteraram a prova de acesso ao curso de Ciências da Comunicação no Porto para a modalidade em português e consegui ser admitida.”

Ao longo da faculdade, fez vários estágios e num deles encontrou a pista que procurava. “No período que passei na Renascença percebi que queria realmente estar numa redação.” Após a conclusão da licenciatura, fez uma pós-graduação em jornalismo multiplataforma na Universidade Nova de Lisboa. Nos seis meses seguintes, acumulou estágios em diversos meios e, no final, acabou por ficar na SIC Notícias.

“Comecei na régie como line producer e foi nessa posição que realmente me apaixonei pela televisão”, confessou. Com o passar do tempo, surgiu a oportunidade de participar em duas formações, e a jovem não hesitou. Durante esse período, dedicou-se a aprimorar as suas habilidades como jornalista e a paixão pela profissão cresceu ainda mais. Em novembro de 2018, o canal apostou nela para apresentar o programa “Volante”.

Nesse momento, Luísa acumulava as funções de apresentadora do programa sobre automóveis e line producer. “Esta experiência positiva fez-me querer melhorar ainda mais. Além disso, tive a sorte de começar a fazer entrevistas rápidas no programa, tudo no meu primeiro ano.” A própria reconhece que é alguém que gosta de estar sempre a aprender. Assim, quando soube de uma formação para pivôs com Rodrigo Guedes de Carvalho, não hesitou. “A experiência foi gratificante; não tinha expectativas. Costumo dizer que, quando surfamos, há um momento em que sentimos que a prancha está bem sustentada na onda, e foi assim que me senti quando me sentei na cadeira e comecei a ler o teleponto.”

Em dezembro de 2020, estreou-se como apresentadora do “Jornal da Manhã”, aos sábados e domingos, na SIC Notícias. “Só percebi o quão tensa estava após terminar o “Primeiro Jornal”, devido ao nervosismo”, revela. Olhando para trás, reconhece que nesse período tinha uma carga de trabalho pesada e diversificada, mas na altura tinha perspetiva uma diferente

“Sempre gostei de desempenhar diversas funções, porque isso dava-me uma melhor compreensão do que acontecia à minha volta e permitia-me acumular outra bagagem.” Em abril de 2023, apresentava o “Jornal da Meia-Noite,” o da “Jornal da Manhã” e ainda fazia peças e reportagens sempre que era necessário, tudo enquanto conciliava com a apresentação do “Volante”.

Pouco depois, Luísa começou a notar que algo estava errado. “Passei por uma fase pessoal mais intensa e desafiadora, e a partir de novembro de 2022, comecei a ter problemas de saúde que nunca tinha tido antes.”

Luísa explica que começou a ter muitas tonturas, picos de febre inexplicáveis e sentia um formigueiro constante nas mãos. Porém, o alerta que a levou a decidir falar com a sua psicóloga só soou quando baralhou o horário de trabalho. “Tinha chegado à redação a pensar que entrava ao meio-dia, quando, na verdade, só entrava às 18 horas. Nessa quinta-feira, percebi que estava em piloto automático e acabei por ter um ataque de ansiedade.”

Após a profissional a alertar para a possibilidade de estar a desenvolver um burnout, Luísa começou a questionar-se sobre os motivos que pudessem justificar aquela situação. “Já tinha passado por momentos em que tinha trabalhado bastante mais e, inicialmente, entrei em negação. Quando chegamos àquele estado não temos capacidade para nada, porque nos sentimos exaustas, mas também é difícil avaliar o grau de esgotamento em que estamos.”

Optou por prosseguir com a sua vida e os meses seguintes foram marcados por constantes idas ao hospital devido a pequenas queixas de saúde que nunca havia sentido.

O síndrome de burnout é frequentemente associado a uma resposta ao stress profissional excessivo. Os sintomas comuns incluem falta de ar, fadiga extrema, alterações no sono e no apetite, bem como tensão muscular. O tratamento normalmente envolve medicação específica e, quanto mais tempo se adiar o tratamento, mais grave se torna a situação.

A jornalista foi pivô do “Jornal da Meia-Noite”.

Em março, Luísa notou que não conseguia dormir uma noite completa há um mês, e houve um dia em que acordou com o lado esquerdo do corpo paralisado, sentindo uma dor intensa no braço que se irradiava para a cabeça e que durou cerca de dois dias. “Foi como se uma luz se acendesse na minha cabeça e percebi que talvez a minha psicóloga tivesse razão.”

Como não estava em condições de continuar a trabalhar, recorreu a uma consulta de medicina do trabalho onde também foi alertada para os sintomas que apresentava. Concluiu que devia solicitar baixa médica e, inicialmente, fez uma semana de pausa. Posteriormente, acrescentou-lhe duas semanas de férias. “Fui fazer o caminho de Santiago e, no último dia, tive um ataque de pânico que associei ao meu regresso ao trabalho. Quando voltei, não conseguia adormecer e tinha muita dificuldade em acordar, não conseguia regular os meus horários.” Nesse momento, decidiu consultar um psiquiatra e, finalmente, avançou para uma baixa médica prolongada.

“Estive oito meses de baixa, mas o tempo de recuperação não é mensurável. Cada pessoa precisa do seu próprio tempo, e as reações à medicação também podem variar”, explica. Durante esse período, Luísa sentiu que não evoluía. Somente no último mês, após mudar de médico e medicação, é que voltou a sentir “algum entusiasmo”. Concluiu que precisava de respeitar rigidamente os seus horários de sono, descansar bastante e tentar não pensar no que se seguiria. “Recuperei e, no regresso, tomei alguns cuidados relativamente aos horários que fazia. Senti-me confortável no trabalho e fui muito bem recebida na SIC, foi uma experiência positiva”, acrescenta.

Quando esteve afastada da televisão, a recuperar, Luísa aproveitou para se dedicar a atividades que a inspiram, como a escrita. A experiência fez com que relembrasse a intenção antiga de realizar um curso que combinasse o jornalismo com assuntos ligados à sustentabilidade. “Já tinha procurado inúmeras vezes por formações possíveis, mas devido ao burnout, esqueci completamente este objetivo.”

Ao efetuar uma nova pesquisa sobre o assunto, encontrou a formação ideal numa universidade na Suécia, um país que sempre a cativou. “Tinha um amigo que vivia lá e adorava. No verão de 2021, estive lá com o programa ‘Volante’ e gostei realmente da mentalidade das pessoas, do ambiente e do estilo de vida. Além disso, o meu pai também trabalhou lá e contava histórias maravilhosas.”

A sua vontade de explorar novas experiências, unida à paixão pela sustentabilidade, motivaram-na a embarcar numa nova jornada e a fazer uma pausa na sua ligação de seis anos e meio à SIC. “Certo dia, numa das minhas muitas pesquisas, encontrei um curso e, ao ler a descrição das disciplinas, percebi que era algo que me interessava muito.” Tinha encontrado a razão que procurava para mudar de vida. A partir de agosto, e durante os próximos dez meses, irá estudar comunicação sustentável na Universidade de Jönköping.

Relativamente ao futuro, Luísa antecipa várias viagens pelo país nórdico. “Vou aproveitar para desenvolver competências que tenho mais subdesenvolvidas como jornalista, possivelmente escrever e voltar à rádio. Neste momento, só tenho bilhete de ida e, assim que me ambientar e adaptar ao novo o ritmo, logo penso no que farei a seguir”, conclui.

 

 

 

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