Dantesco. É este o nome que Raquel Loura atribui ao cenário que se vive atualmente nos hospitais portugueses. Infernal, terrificante ou aterrador são sinónimos que descrevem estes dias no Serviço Nacional de Saúde, como muitos outros profissionais de saúde já fizeram questão de testemunhar nas redes sociais.
Raquel, que é enfermeira, é um deles. Esta terça-feira, 19 de janeiro, utilizou a sua conta de Instagram para conversar com quem ali passa e relembrar que isto “não é uma brincadeira” e que “está mesmo a acontecer”.
“Neste momento, já se escolhe quem vive e quem morre. Estão a ser desligados ventiladores a pessoas com 60/70 anos. Ouçam bem. 60/70 anos. Podiam ser os nossos pais/avós. Para se ligarem a pessoas de 30/40. Não há para todos. E não são só ventiladores que fazem falta. Faltam camas. Faltam condições dignas de trabalho. E mais importante que isso, faltam profissionais”, desabafa.
A enfermeira fala, inclusive, num cenário de guerra. “Há pessoas a morrer na urgência indignamente. E não só nos serviços de urgência. Sozinhos e abandonados. Pensem só dois segundos. E se fossem os vossos pais? Ou avós?”, questiona.
“Já se escolhe quem vive e quem morre”
“A minha cara está assim. Imaginem a alma. Neste momento vivo um dia de cada vez. Literalmente. Valha-me a minha família”, continua.
Neste testemunho, Raquel Loura diz que todos somos responsáveis, pelo que todos temos o dever de nos protegermos a nós e aos outros. “Já se escolhe quem vive e quem morre. E acreditem. Não são os meus. Mas é f^*#^%* fazer este tipo de escolhas”.
A enfermeira pede aos portugueses que deixem de parte os passeios higiénicos de trela sem cães, assim como os passeios à beira mar ou as dezenas de idas por semana ao supermercado quando se podem fazer as compras de uma só vez. “Só vos pedem que sentem a m^%#*^ do cu no sofá. Só isso”, acrescenta.
Por fim, Raquel reforça que o cenário é realmente dantesco, pedindo reflexão individual e que se fique em casa.
Porém, não é a primeira vez que a enfermeira usa as redes sociais para fazer apelos. Em julho de 2020, relembrava que não se podia falar em vitória, já que essa estava longe de chegar. Se havia dúvidas, a pandemia que se vive neste momento deixar margem para poucas ou nenhumas.
“Debaixo deste escafandro estou eu. Eu e todos os meus colegas que todos os dias lutam. Os doentes só veem o sorriso nos olhos. Muitas vezes reconhecem-nos assim. Sabem o quão duro é passar horas dentro desta sauna ambulante? Sem ter acesso a água. A casa de banho. Àquilo que nos é essencial. Só passando mesmo”, desabafou na altura.
O discurso que usou naquela publicação aplica-se mais uma vez: “Não relaxem. Este pesadelo ainda não acabou. Temos que ser conscientes e prudentes. Não facilitar em nada. Nada mesmo (…) É tempo de reflexão e de empatia. É tempo de Fé.”