O 5 de junho de 2020 ficará marcado para sempre na vida de Alejandra Wilcox. Foi o dia da morte do seu filho, que nasceu prematuro, às 23 semanas, a 23 de abril, e que sofreu várias complicações de saúde por isso mesmo. Nos últimos meses, os pais de Ronan tentaram mantê-lo ao máximo a salvo do coronavírus. Agora, Alejandra teve força para expressar como é passar pela morte de um filho durante uma pandemia.
“Todos os dias, durante 42 dias seguidos, passei por vários pontos de verificação de segurança para chegar até ele, prendi a respiração ao andar pelos corredores do hospital, esfreguei as mãos com água quente até que a pele ao longo dos meus dedos começou a ficar em ferida, usei uma máscara enquanto soluçava, enquanto bombeava a cada três horas, enquanto o segurava, enquanto dava beijos sem encostar os lábios contra a sua testa minúscula”, pode ler-se num relato publicado no “The Huffington Post” a 8 de novembro.
É que, além das dificuldades pelas quais passa um bebé que nasce prematuro, Ronan tinha mais uma batalha pela frente: ficar a salvo do novo coronavírus, já que nasceu num pico da pandemia de Covid-19.
Alejandra, que é autora convidada da publicação americana, diz que se sentia a viver numa daquelas séries de televisão de médicos. Mas, desta vez, na vida real. “A vida do meu filho. A minha vida”, escreveu. E continuou: “Ele estava a morrer e não havia nada que eu pudesse fazer para impedi-lo.”
Para quem nunca teve um bebé prematuro numa pandemia, Alejandra fez questão de explicar como é.
“Farás um teste rápido à Covid-19 depois de vomitar duas vezes na ambulância a caminho do hospital. Ficarás tão exausta e humilhada que chorarás como uma criança. Depois de entrares em trabalho de parto, o teu parceiro não poderá deixar o hospital até que tenhas alta. Nem mesmo para tirar algo do carro no estacionamento. Quando tu e o teu bebé quase morrem em trabalho de parto, nenhum outro familiar ou amigo terão permissão para te visitar.”
Depois do parto, vem a fase seguinte: a obsessão por garantir que toma todas as precauções para o indefeso filho não ser infetado.
“Ficas obcecada por não ter lavado o suficiente as peças da bomba para retirar o leite. Ficas obcecada por desinfetante de mãos. Ficas obcecada com o quão quente está a água da pia, se usaste sabão suficiente, se esfregaste com força suficiente. Se precisares de parar numa loja no caminho para casa, ficas obcecada com aquilo em que tocas.”
A jornalista de rádio, que atualmente mora no norte do Colorado, nos Estados Unidos da América, mostra-se também indignada com aqueles que reclamam do quão inconveniente e desconfortável as máscaras são. “Para todas as pessoas que não se dão ao trabalho de usar uma máscara, tu queres gritar: ‘Estou a tentar manter o meu bebé vivo! Por favor, deixem-me manter o meu bebé vivo!'”
E continua: “Existe muita raiva. Raiva porque as pessoas ainda reclamam por não poderem ir a um restaurante ou cortar o cabelo quando os avós não podem conhecer o neto”.
Alejandra lamenta, também, o facto de não ter tido mais ninguém a apoiá-la presencialmente na unidade de terapia intensiva neonatal, devido às restrições de visitas durante a pandemia, quando estava a passar por aquela que, admite, é uma das decisões mais difíceis de qualquer mãe: fazer a escolha de manter o bebé vivo ou não.
“Isso é algo que nenhum pai quer imaginar e a Covid-19 não mudou isso, mas eu rapidamente aprendi que esta pandemia agrava o sofrimento. É horrível planear um funeral para uma criança.” E desabafa ainda: “É pior quando pensas que deves fazer uma lista de convidados e manter o distanciamento social. É ainda pior quando pensas: eu tenho sorte. Tive sorte de eles terem aliviado algumas das normas das funerárias no mesmo dia em que o meu bebé morreu.”
“Todas as vezes que o meu bebé olhou para os pais, desde o primeiro dia em que, finalmente, conseguiu abrir um olho, viu-nos com aquelas máscaras. Agora, enquanto olha para nós pela última vez, finalmente vê os nossos rostos completos. Os nossos rostos reais. Espero que ele saiba quem éramos”, disse esta mãe que espera maior consciência por parte de todos, dado o momento que se vive em todo o mundo.