Turismos Rurais e Hotéis

São Miguel: o antes e depois deste incrível hotel abandonado

O Monte Palace foi um dos empreendimentos mais luxuosos da ilha, mas ninguém queria ir lá dormir. Fechou em apenas 19 meses, há quatro anos começaram os roubos. Agora está à venda no OLX.

No dia em que o diretor do Monte Palace recebia em Lisboa o prémio de Hotel do Ano, em 1990, o staff em São Miguel era informado de que o hotel de cinco estrelas ia fechar. Apenas um ano e meio depois de abrir, a unidade mais luxuosa dos Açores declarava falência. Os meses que se seguiram foram vergonhosos para o turismo nacional — os jornais classificaram-no como a “burla do século” —, mas o pior ainda estava para vir. Em 2011, o edifício deixou de ser vigiado e o saque foi imediato. Móveis, portas, carpetes. Levaram tudo, até os elevadores.Esta terça-feira, 10 de maio,o hotel no miradouro da Vista do Rei, mesmo em frente à Lagoa das Sete Cidades, foi colocado à venda no Imovirtual e OLX. Ao futuro comprador podemos garantir uma coisa: não tem nada lá dentro.

“Um dos vendedores de artesanato do miradouro contou-me que os turistas às vezes ficavam confusos. Achavam que o hotel estava em obras, uma vez que ouviam barulhos de marteladas lá dentro”, conta à NiT Jorge Loures, um jovem de 20 anos que durante os últimos quatro anos levou a cabo uma profunda investigação sobre o Monte Palace. “Não eram obras. Eram pessoas a levar banheiras.”

Ao contrário do que muitas pessoas pensam, o Monte Palace não foi o primeiro hotel de cinco estrelas a abrir em São Miguel. O primeiro foi o seu “irmão mais velho”, o Bahia Palace. Também foi um fracasso: abriu e fechou duas vezes, até reabrir como um quatro estrelas em 2003. À terceira foi de vez, já que o hotel ainda se mantém em Água D’Alto, Vila Franca do Campo. Comprado pelo grupo Pestana em 2014, reabre ainda este mês com o nome de Pestana Bahia Praia.

O Monte Palace não teve a mesma sorte. Abriu a 15 de abril de 1989 com direito a concerto de Fafá de Belém, terminou no OLX. Em 2015 foi comprado por um grupo de investidores estrangeiros, mas não aconteceu nada. Agora voltou para os sites de venda online, desta vez com um pedido de quase 1,5 milhões de euros—uma valor bem superior aos anteriores cerca de 380 mil euros.

26 anos depois, São Miguel voltou a ter um hotel de cinco estrelas. A abertura também foi polémica — recorde a reportagem da NiT.

Jorge Loures tinha 16 anos quando visitou o hotel pela primeira vez. “Não cheguei a passar das portas automáticas, mas espreitei lá para dentro. Estava tudo limpo, tudo vazio mas organizado. Era incrível porque, por fora, o hotel parecia ter décadas. Por dentro, parecia apenas que alguém tinha ido de férias. Só isso, de férias.” O jovem natural de São Miguel regressou duas semanas depois, precisamente quando o hotel começou a ser saqueado. Já nada estava como antes.

Às vezes os turistas ficavam confusos e perguntavam aos vendedores de artesanato se o hotel estava em obras.“Não eram obras. Eram pessoas a levar banheiras”, diz à NiT Jorge Loures

“O vandalismo já tinha começado. Faltavam portas, as carpetes estavam reviradas, os vidros partidos.” Nos dois anos seguintes, Jorge Loures regressou cerca de dez vezes ao hotel. Em fotografias, acompanhou a destruição do local — que foi ficando pior com o tempo. “Até os elevadores levaram.” Foi nesse momento que o jovem, atualmente com 20 anos e a estudar Comunicação na Universidade do Porto, começou a investigar a história do Monte Palace.

O resultado é impressionante: Jorge Loures entrevistou várias pessoas envolvidas com o espaço, conseguiu juntar centenas de fotografias do antes e do depois e passou horas enfiado nos arquivos à procura de notícias nos jornais sobre o tema. “Tudo o que fizesse alusão ao hotel, eu guardava”, conta à NiT. Em 2013, Jorge Loures publicou no YouTube o vídeo “Hotel Monte Palace, História de uma Ambição Desmedida”, que documentava a história de um dos hotéis mais impressionantes dos Açores.

88 quartos, dois restaurantes, três salas de conferência, um cabeleireiro, uma tabacaria, um banco. O hotel também tinha uma discoteca, um café, um bar e até um corredor com vitrines cheias de souvenirs. Tudo isto a funcionar com a ajuda de uma equipa de 130 pessoas. O Monte Palace era um verdadeiro luxo para a época.

Até demais: “Coisa fina, coisa seleta — basta dizer que todo o material foi importado, desde as alcatifas aos móveis, desde os adereços aos mármores”, lia-se num dos recortes de jornal recolhidos por Jorge Loures, e que foi publicado após o encerramento do cinco estrelas a 26 de novembro de 1990.

“Os turistas esvaziavam as vitrines dos souvenirs, compravam tudo.” Os restaurantes, o bar e a discoteca também traziam lucro para o restaurante, mas infelizmente a faturação terminava aqui. Passavam-se semanas sem que entrasse uma única pessoa no hotel.

“À noite o hotel era um bocadinho assustador, principalmente quando não havia hóspedes. Uma das rececionistas contou-me que, uma noite, a porta automática abriu-se de repente. Estava muito escuro e as funcionárias não viam nada. Aproximaram-se, perguntaram quem era, mas ninguém respondeu. Quando chegaram lá fora, viram uma vaca a mugir.”

Em 2011, o grupo madeirense Siram, que detinha então o hotel de cinco estrelas, faliu. O hotel deixou de ter vigilância— durante 21 anos foi guardado por

guardas e por cães — e o caos instalou-se. Jorge Loures acompanhou essa transição. Enquanto vasculhava o passado, visitava o hotel para acompanhar a destruição. À NiT, mostra as impressionantes imagens do antes e do depois.

As imagens atuais pertencem a Jorge Loures, as antigas são da Fotografia Nóbrega mas foram retiradas do vídeo “Hotel Monte Palace, História de uma Ambição Desmedida” com a autorização do autor.

Carregue na imagem acima para ver as fotos do antes e depois.

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