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Edifícios abandonados: a história do incrível (e destruído) Pavilhão Carlos Lopes

É um espaço histórico e emblemático de Lisboa e esteve ao abandono durante mais de dez anos. As obras de requalificação começaram agora. Nós contamos-lhe a história e mostramos-lhe as fotos.
Foto de Lugares Abandonados

Estátuas e azulejos partidos, tinta estalada, entulho no chão, latas de refrigerante esquecidas em cima das mesas. O Pavilhão Carlos Lopes, situado no Parque Eduardo VII, em Lisboa, veio do Brasil e recebeu durante muitos anos competições desportivas, espetáculos e até importantes comícios políticos. Foi um local icónico na cidade, mas caiu em desgraça. Esquecido, abandonado, sozinho, acabou por fechar em 2003 por falta de condições de segurança.

Esteve abandonado durante 13 anos. A crueldade para com o Pavilhão Carlos Lopes terminou em maio deste ano, quando foram finalmente celebrados contratos para reabilitar o edifício. E já é oficial: em 2017, o edifício vai reabrir ao público como espaço de eventos, tendo já um marcado — o Peixe em Lisboa. Agora que as obras de requalificação já começaram, vale a pena lembrar a história de um edifício tão emblemático como este — e recordar as imagens impressionantes do estado de degradação a que chegou.

Tem nacionalidade portuguesa no sangue (ou nos tijolos), mas a história do Pavilhão Carlos Lopes começou no Brasil. Projetado pelos arquitetos Guilherme e Carlos Rebello de Andrade e Alfredo Assunção Santos, o pavilhão foi construído a pensar na Grande Exposição Internacional do Rio de Janeiro, realizada em 1922. O nome do evento pode soar aborrecido, mas foi histórico para todo o mundo. Para além das celebrações dos 100 anos de independência do Brasil, este foi o primeiro grande evento após o fim da Primeira Guerra Mundial. Todos os países que participaram queriam exibir-se — e Portugal não era exceção.

Naquela época, o edifício imponente não recebeu o nome de Pavilhão Carlos Lopes — não poderia, claro, ainda faltavam 25 anos para o atleta português nascer e 62 para ganhar a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de Los Angeles. Na altura, ficou apenas com o nome Pavilhão Português das Indústrias, e foi um dos vários pavilhões que Portugal apresentou no evento.

Era um edifício imponente. Para além do trabalho notável dos arquitetos, a fachada principal e os interiores estavam revestidos por painéis de azulejos impressionantes. Na porta do edifício o destaque ia para as esculturas, uma dedicada à Arte e outra Ciência.

No jornal “A Vanguarda”, publicado a 23 de maio de 1922, e segundo cita o blogue “Restos de Colecção”, salientava-se a facilidade de mobilidade destes pavilhões: “(…) é por isso mesmo que o esqueleto deles é em ferro e os demais elementos que os constituem são na sua maioria suscetíveis de larga duração, permitindo que sem avarias os pavilhões, finda a exposição, se possam desarmar e utilizar em qualquer outro local.”

Mais ainda demoraria algum tempo até ao edifício regressar a Portugal. Os primeiros anos foram passados no Brasil, tendo inclusivamente chegado a receber a primeira exposição de automobilismo do Rio de Janeiro, em 1925. O regresso a casa aconteceu em 1929, quando o edifício, construído sobre uma estrutura metálica, foi desmontado, separado em peças e enviado pelo Oceano Atlântico de volta a Portugal.

O local escolhido para a colocação do Pavilhão foi o Parque Eduardo VII, em Lisboa. Denominado então Palácio das Exposições, abriu em 1932 por ocasião da Grande Exposição Industrial Portuguesa.

“Isto era a nossa casa, era a casa da seleção”, recordou o ex-internacional de hóquei, António Ramalhete

O amor assumido ao universo desportivo aconteceu em 1946, quando o edifício sofreu obras profundas — foi nesta altura que ganhou as famosas bancadas, que o transformaram definitivamente num edifício ligado ao desporto. Para que não restassem dúvidas, recebeu o nome Pavilhão dos Desportos. No ano a seguir, realizou-se no local o Campeonato do Mundo de Hóquei em Patins em 1947, em que Portugal se consagrou campeão.

“Meu Deus. Quem te viu e quem te vê”, disse António Ramalhete, ex-internacional de hóquei, numa entrevista à SIC, quando chegou ao interior do pavilhão, nos anos em que esteve abandonado. “Quando se entra aqui parece que estamos numa zona de guerra.”

“Cada jogo que se fazia neste pavilhão era casa cheia. Em todos os campeonatos, seja do mundo seja da Europa, que a seleção ia fazer fora, os treinos eram realizados aqui. Isto era a nossa casa, era a casa da seleção.”

Quando os atletas entravam no Pavilhão dos Desportos, sentiam-se importantes. E não era caso para menos: naquela casa só entravam grandes atletas, por isso treinar naquele edifício já era motivo de orgulho. “Na nossa juventude, este era um pavilhão onde só jogavam as grandes figuras.”

Mas nem só de desporto ficou feita a história deste pavilhão. A acústica do edifício era ótima, por isso realizaram-se ali muitos espetáculos e concertos. Na política, aconteceram comícios da União Nacional (a organização política que apoiava o Estado Novo) e eventos de propaganda do governo. Após o 25 de abril, foram várias as figuras políticas que fizeram discursos emblemáticos neste pavilhão.

A 27 de agosto de 1984, o edifício passou a chamar-se Pavilhão Carlos Lopes, em homenagem ao atleta português que, pela primeira vez na história, conquistou uma medalha de ouro nos Jogos Olímpicos.

Depois dos tempos áureos, veio a decadência — em 2003, o pavilhão foi obrigado a fechar por falta de condições de segurança.

Foram precisos mais de dez anos para se arranjar uma solução para o pavilhão desportivo mais emblemático de Lisboa. O projeto para salvar o edifício foi aprovado em maio deste ano — o direito de exploração está neste momento com a Associação de Turismo de Lisboa, que adjudicou contratos para requalificar o interior e exterior do edifício. O pavilhão deverá abrir em 2017 como local para a realização de conferências, exposições, provas desportivas, entre outros eventos. O primeiro já está marcado, o Peixe em Lisboa, que vai decorrer no Pavilhão Carlos Lopes de 20 de março a 9 de abril.

Recorde os artigos sobre o Palácio da Comenda, o Aquaparque, o Restaurante Panorâmico, o Hotel Foz da Sertã, os Sanatórios do Caramulo, Águas de Radium e Presídio da Trafaria, todos abandonados.

Carregue na imagem acima para ver as fotografias do abandono do Pavilhão Carlos Lopes, divulgadas pela página de Facebook Lugares Abandonados.

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