“Notícias da Corte. Parece que sua Majestade, a Rainha, vai para Cascais, na segunda-feira, e que El-Rei a acompanhará”, escrevia o “Jornal do Comércio”, a 11 de setembro de 1870. A pitoresca vila junto à beira-mar tornou-se um dos destinos de veraneio da elite portuguesa nas últimas décadas do século XIX. “Não a acharam feia, notaram a pureza do seu ar, descobriram que a praia tinha belezas, encontraram serenas as ondas do oceano que ali vem quebrar-se, pareceu-lhes bonita a costa”, lê-se no livro de 1873, “História de Cascais e do seu Concelho”, de Pedro Lourenço de Seixas Borges Barruncho.
A localização privilegiada fez com fosse considerado “um ótimo local para gozar a vida”. A partir deste momento, as principais famílias nobres de Portugal começaram a frequentar as ruas da vila, a arrendar casa, a comprar e a construir os seus chalets, palacetes e palácios. Um deles ainda hoje se destaca pela sua arquitetura: o Chalet Ficalho.
O edifício foi mandado construir em 1887 por António Máximo da Costa e Silva, barão e visconde de Ovar, e a mulher Maria Josefa de Mello, futura condessa de Ficalho. A filha do casal, Helena Mello da Costa, sofria de problemas respiratórios — e o médico tinha-lhe receitado ar do mar. Neste contexto, fez um pedido aos responsáveis da vila “desejando construir uma propriedade num terreno que possuía nesta vila”.
O pedido foi aprovado e as obras de construção arrancaram no início de 1898. O quarteirão do clube da Parada, o local onde a família real passava os dias em jogos e outras atividades, foi o escolhido para implantar o edifício.
Os telhados de forte inclinação cinzento-esverdeados, as janelas altas, as portadas vermelhas e o jardim botânico com espécies exóticas ainda hoje se destacam na região. “O jardim foi desenhado pelo pai da condessa de Ficalho, um grande botânico que foi também um dos fundadores do Jardim Botânico de Lisboa”, conta à NiT Maria Chaves, herdeira da casa.
Após quase dois anos de obras, o Chalet Costa e Silva — nome dado na altura — ficou finalmente concluído. A inauguração aconteceu a 21 de outubro de 1898 e foi um dia memorável: “Houve guitarradas, coros, descantes e o belo fadinho, cantado com sentimento”, escreveu o “Diário Ilustrado” na altura.
Contudo, em 1902, volvidos quatro anos sobre a construção do edifício, o casal separa-se por razões ainda hoje desconhecidas. Maria Josefa acabou por ficar com a propriedade, que frequentou como residência de férias até morrer, em 1941. Desde então, o imóvel ganhou o apelido de Chalet Ficalho.
A casa foi herdada pelo sua filha, Helena, que passava lá todos os verões com os filhos e netos até 1963, data em que decidiu torná-la na sua morada permanente. O mesmo aconteceu, depois, com a sua filha Maria d’Assumpção, que se mudou com a família para o chalet. “A casa foi passando de geração em gerações até chegar à minha. Viveram-se aqui muitas histórias, guardámos muitas recordações e é um sítio muito estimado por todos”, revela Maria Chaves, de 70 anos, que faz parte da quarta geração da família e acabou por herdar a propriedade.
O Chalet vai abrir como guest house
Devido à dimensão do edifício, tornou-se “muito difícil conservar a casa”, que já precisava de uma enorme recuperação. “Podia ter sido mais fácil vender, mas não era realmente isso que queríamos. Decidimos manter a casa e, para a rentabilizar, vamos abrir como guest house”, explica.
As obras começaram há cerca de dois anos, após ter sido aprovado o projeto de arquitetura de alteração e ampliação do edificado. O arquiteto Raúl Vieira, foi o responsável pela adaptação do chalet a alojamento local. As características principais, tanto interiores e exteriores, mantiveram-se, apesar do “trabalho de restauro muito profundo”, que se estendeu às madeiras e aos móveis.
“Tem uma identidade nova, mas preservamos todas as características de uma casa do século XIX”, realça. Os azulejos, o chão, as pinturas, os vidros, as portadas, os lustres e as peças de mobiliário foram todas restauradas. Outras, como os sofás, ganharam réplicas.
O Chalet Ficalho vai abrir aos hóspedes já este sábado, 22 de julho. O edifício de três andares é composto por nove quartos, todos com uma casa de banho privativa, e várias salas espalhadas pelos andares, cujo acesso é feito a partir de uma enorme escadaria ou do novo elevado.
Assim que os hóspedes entram no palacete deparam-se com um hall enorme, que nos encaminha para as várias divisões: a sala de estar com lareira, apelidada sala comprida; a sala redonda; um escritório; e a sala de jantar, com uma extensa mesa. A grande novidade encontra-se no exterior, onde poderá encontrar uma piscina. Foi construída no jardim que, em tempos, era conhecido como “o jardim das palmeiras”. “Antes das obras tivemos de abater várias palmeiras, cerca de 15, devido à praga do escaravelho. Já estavam mortas”, lamenta Maria.
Embora não tenha muitas das espécies originais, o jardim botânico da propriedade, “um espaço verde muito grande para uma zona como Cascais”, continua a ser um dos grandes atrativos. O espaço verde mantêm-se bem preservado e a ideia é conseguir repor o original, com a ajuda do Jardim Botânico de Lisboa.
Além de abrir como guest house, o Chalet Ficalho poderá receber vários tipos de “eventos sossegados”, como sunsets de fim de tarde ou jantares de reuniões. No futuro, pretendem realizar algumas exposições de autores menos conhecidos, assim como concertos e conferências. As reservas já estão disponíveis online. Os preços começam nos 225€ por noite.
A seguir, carregue na galeria para ficar a conhecer melhor o renovado Chalet Ficalho.