Não foi fácil no primeiro confinamento e poderá ser ainda mais complicado no segundo. Segundo vários especialistas, a falta das brincadeiras e de socialização, aliadas a um aumento da exposição aos ecrãs, podem originar mais birras, desentendimentos e frustrações das crianças e jovens que regressam novamente à regra do ficar em casa e não ir à escola — desta vez, e pelo menos para já, sem aulas à distância.
A agência Lusa falou com vários médicos e profissionais do setor, que são consensuais em avisar que birras, impaciência, raiva, frustração e situações de conflito são espetáveis de acontecer nas próximas semanas. “Não estamos a entrar neste confinamento como entrámos no outro, em que tudo era desconhecido e uma incógnita”, explica Raquel Raimundo, presidente da delegação regional do sul da Ordem dos Psicólogos.
O medo, a angústia, a tristeza, a inquietação e a insegurança podem facilmente despoletar estas manifestações, acredita a psicóloga escolar, uma vez que o regresso a casa significa deixar para trás mais momentos e etapas “cruciais na vida” destas crianças e jovens. “Eles já têm uma ideia do que é estar confinado”, salientou.
Para a presidente da Sociedade Portuguesa de Pediatria, Inês Azevedo, o novo confinamento, delineado de “forma intempestiva e não programada”, deixará marcas no futuro das novas gerações. “Nunca passamos por uma situação de confinamento de crianças tão dramática como esta”, afirmou a pediatra, acrescentando que o prolongamento do confinamento vai ter “impactos negativos, tanto na aprendizagem formal como informal”.
Da mesma forma, a “incompreensão do que se está a passar e o medo do desconhecido” podem ter repercussões na saúde mental e desenvolvimento das crianças, defendeu Vera Ramalho, psicóloga especialista em psicoterapia. “Os pais devem clarificar à criança porque voltamos para casa, explicando o que se passa com palavras adaptadas à sua idade, garantindo que elas compreendem”, esclareceu.
As três especialistas defenderam igualmente a necessidade de não se deixarem as crianças e jovens cujas famílias são “mais disfuncionais” desprotegidas. “A escola é um suporte muito importante, é assim que muitas situações são sinalizadas e é por isso importante não deixar estes miúdos desprotegidos”, disse Raquel Raimundo.
Todas consideram ser necessário estabelecer rotinas, promover horários de sono, uma boa alimentação, atividades físicas e até estimular a socialização. “É importante passar a mensagem de que a pandemia não vai ser para sempre e que o confinamento há de terminar”, defendeu Raquel Raimundo.
As escolas portuguesas, de todos os níveis de ensino, estão encerradas desde sexta-feira e durante duas semanas, uma medida anunciada na quinta-feira pelo Governo para conter a pandemia de Covid-19. Segundo foi avançado esta segunda-feira, a situação será quase certamente para perdurar além dos 15 dias: num email enviado pelo Ministério da Educação aos vários estabelecimentos de ensino é pedido que se preparem para as aulas à distância, tal como aconteceu em 2020, a pode acontecer a partir de 8 de fevereiro, quando acaba a atual interrupção letiva.
Portugal registou, esta segunda, mais 6.923 infetados de Covid-19, pelo que o número total de casos no nosso País desde o início da pandemia sobe para os 643.11.