A crise ambiental que vivemos já faz parte da consciência de muitos. Os glaciares derretem, as temperaturas atingem graus impensáveis e a poluição dos oceanos não parece diminuir. Embora muitos estejam cientes do que se passa, e alterem alguns hábitos para ajudar o ambiente, poucos os que se dedicam à resolução do problema da forma como Andreas Noe, também conhecido por The Trash Traveler, o faz.
Visitou Portugal pela primeira vez em 2014, naquela altura como um simples turista, sem saber que se iria apaixonar pelo nosso País. Uns anos depois, em 2017, voltou a Lisboa, e aqui permanece até aos dias de hoje. Quando não estava a trabalhar, podíamos encontrar o biólogo molecular na praia, a surfar e a aproveitar a natureza.
No entanto, os momentos de lazer rapidamente se transformavam em preocupação. “No inverno, os municípios não limpavam as praias. Havia plástico em todo o lado. Despedi-me do meu emprego há três anos e comecei o The Trash Traveler. Queria fazer algo contra aquilo, chamar à atenção para o problema com positividade.”
Podíamos pensar que desde aí que o seu principal objetivo passou a ser recolher lixo dos areais, da natureza, e salvar o planeta, mas não: “O objetivo não é limpar as praias”, conta-nos. “É mostrar que a poluição é problemática e inspirar pessoas a fazerem algo contra ela.” Algo que poderá criar um efeito de bola de neve, com uma pessoa a influenciar outra e por aí adiante. As mudanças podem começar no cidadão comum, mas também pretende que as grandes empresas sejam agentes no processo. “Quero criar pressão nas marcas e governos para investirem na economia circular e afastarem-se da mentalidade do uso único [do plástico].”
As suas iniciativas foram evoluindo com o passar dos anos — uma evolução que, infelizmente, anda de mãos dadas com o agravar dos problemas ambientais. Em 2020, decidiu andar 58 dias por toda a costa portuguesa, sem descanso. “Não andei só a caminhar, também limpei durante o percurso”, conta. Durante a jornada, vários portugueses o ajudaram. Se antes já tinha razões para amar o País, depois da “The Plastic Hike” a lista apenas aumentou: “A quantidade de pessoas que se importam [com o ambiente] em Portugal fez-me ficar”, confessa.
Atualmente, o alemão de 33 anos está-se a preparar para um novo percurso. Arranca a 22 de abril, em Sintra. “Vou pedalar três mil quilómetros por Portugal numa bicicleta velha. Todos os dias (sem nenhuma folga) vou pedalar entre 40 a 50 quilómetros, limpando o que encontro. Convido o público em geral a juntar-se à minha recolha de lixo e também já organizei ações em escolas e municípios. Mais uma vez, este projeto não será sobre a limpeza em si, mas uma forma de chamar a atenção para este problema”, explica.
Consigo leva apenas uma garrafa reutilizável, para mostrar que é possível reduzirmos a nossa produção de lixo, “que tem sido aproximadamente de 512 quilos por pessoa em Portugal.” Também será acompanhado por Raquel Fortuna Lima, uma videógrafa, que o seguirá na sua caravana. A cada paragem, Raquel tratará de comprar apenas comida local, ecológica e livre de plástico.
Durante as suas viagens por Portugal, Andreas, The Trash Traveler adianta que recolheu mais de duas toneladas de lixo: 1,6 toneladas de plástico e 1,1 de beatas de cigarro. Pelo meio, nos períodos em que não teve nenhuma iniciativa decorrer, acredita ter juntado mais de 1 tonelada de lixo. Estes números, porém, apenas servem para destacar uma questão mais difícil de resolver. “Temos outro problema que são os microplásticos. A costa está cheia deles e é quase impossível livrarmo-nos deles nas praias, na natureza e no oceano. Todos os grandes plásticos acabam por se transformar em microplásticos. Inclusive já foram encontrados em sangue humano e em placentas”, revela o viajante.
Claro que uma viagem (sem pausas) tão longa não é, de todo, fácil, e a exigência física que estas jornadas pedem têm sido enormes desafios para o The Trash Traveler. “Em dois meses, não há pausas. E vou estar sempre a preparar conteúdo para as redes sociais para incentivar mais pessoas a participarem. Vai ser rock n’ roll durante dois meses.” E não sabe como o seu corpo reagir ao esforço.
No seu íntimo, Andreas Noe é um introvertido, e isso também acaba por ser um problema: “Tento sempre envolver o maior número possível de pessoas, e depois acabo sempre a pensar ‘o que é que estou a fazer aqui?'” Pensa, especialmente, nas apresentações que irá fazer nas escolas, com o seu “português imperfeito”. “É uma boa ideia”, admite, “mas sinto-me sempre ansioso.” Para tornar este momentos mais divertidos e descontraídos, além da garrafa de água, irá acompanhado por um ukelele.