Urbex é uma abreviação da expressão em inglês urban exploration. Em português é traduzida para exploração urbana, e quase sem darmos por isso, está a tornar-se uma subcultura com cada vez mais seguidores, especialmente nas redes sociais. Os exploradores urbanos focam-se em locais abandonados que passam despercebidos no nosso dia a dia. E qualquer um, de qualquer idade, o pode fazer.
Daniel Pereira tem 17 anos e sempre viveu em Lisboa. Atualmente está no 12.º ano, na área de Ciências e Tecnologias. A escola ocupa-lhe a maior parte do tempo mas quando não está nas aulas podemos encontrá-lo em edifícios deixados ao esquecimento.
Anda quase sempre de uma câmara da mão, seja para tirar fotografias ou para gravar vídeos para o seu canal de YouTube, onde já conta com mais de 40 mil subscritores. Os seus vídeos são um fenómeno de popularidade — o mais visto soma mais de 294 mil visualizações.
O gosto pela exploração ganhou-o em miúdo, nas visitas que fazia a museus e monumentos com o pai. A paixão pelo urbex havia de chegar uns anos mais tarde. “Em 2012, numa viagem a Coimbra, proporcionou-se uma visita a uma quinta abandonada com uma enorme casa brasonada que calhava em caminho, na qual entrámos, mas apenas pela mera curiosidade de ver como era”, conta o jovem explorador à NiT. A primeira recordação que tem da exploração urbana é dessa “antiga casa senhorial numa quinta perto de Penela, que atualmente já se encontra restaurada”, recorda.
Impressionado com a visita à casa abandonada, Daniel Pereira pesquisou pelo sítio que tinha acabado de visitar. Encontrou mais do que procurava: vários grupos e páginas na Internet onde muitos utilizadores se juntam para partilharem fotos de espaços edifícios abandonados. “Comecei então a publicar algumas das fotos que ia tirando”, diz.
Em 2017, após uma exploração no Palácio da Comenda, na Arrábida, decidiu começar a levar o hobby mais a sério, e o seu amor pela exploração começou a passar para o pai. Se, até 2012 eram os monumentos e os museus que os juntava, de 2017 em diante passaram a explorar juntos outro tipo de locais históricos.
Daniel Pereira tem-se tornado conhecido sobretudo no YouTube. Tal como muitos outros projetos que acabaram por se tornar num sucesso, começou por ser uma diversão. “Em 2017, na referida exploração ao Palácio da Comenda, gravei um pequeno vídeo que publiquei quase por brincadeira, sem saber no que iria resultar”, começa. “Foi o primeiro do canal. Nos meses seguintes comecei a gravar mais alguns, pensando que, já que explorava e fotografava aqueles lugares que um dia iriam deixar de ser como os conhecíamos, porque não gravar também em vídeo? Para minha surpresa, tive números de visualizações consideráveis para quem fazia aquilo pela piada, por isso, achei que poderia ser interessante ter uma plataforma dedicado ao tema e assim foi. Partindo da conta onde já tinha alguns vídeos públicos, comecei a levar mais a sério a ideia até tornar naquilo que é atualmente.” Daquela brincadeira nasceu um canal que, no total, soma quase quatro milhões de visualizações.
Quando os seguidores começaram a aumentar, Daniel Pereira trocou a câmara do telemóvel por uma câmara DSLR, “em busca de maior qualidade nas fotos e vídeos que fazia”, aparelho com que filma até hoje.
Depois de gravar os vídeos, faz-se do resto: “Todo o conteúdo que publico, tanto fotos como vídeos, desde a captura à edição, é produzido única e exclusivamente por mim”, revela. “Isto é a minha paixão”, acrescenta.
“Faço-o por gosto. Procuro sobretudo três coisas: dar a conhecer o meu trabalho sobre estes locais desconhecidos, na maioria, o público em geral; preservar desta forma uma memória dos mesmos, já que há locais deveras fabulosos mas que não duram para sempre, seja por serem vandalizados, demolidos, incendiados ou qualquer outro motivo — uma forma de mostrar que também é possível encontrar beleza na decadência”, revela.
Quem passar pelo canal de YouTube e Instagram de Daniel Pereira pode ficar com a sensação que os sítios abandonados quase o encontram, o que não é de todo verdade. O processo de busca destes edifícios é bastante saturante e demorado. “A descoberta destes sítios envolve muita pesquisa. Às vezes é preciso uma muita paciência para andar horas pelo Google Maps à procura de casas que pareçam abandonadas para depois ir lá verificar se isso, de facto, se confirma.” Muitas vezes é durante essas viagens que outros sítios abandonados e dignos de exploração acabam por aparecer. Daniel Pereira faz também parte de um grupo de exploradores, que partilham localizações entre si, apenas para os membros.
Os exploradores urbanos costumam manter um grande secretismo quanto aos locais que visitam. Para o jovem, se um sítio abandonado e desconhecido começar a passar “sucessivamente de mãos em mãos” então acaba por perder o seu valor, visto que passa de desconhecido a conhecido. Acrescenta ainda que, por vezes, caso a localização seja partilhada, pessoas com intenções menos boas acabam por lá passar, vandalizando e roubando tudo o que encontrarem, algo que, segundo nos conta, já aconteceu.
O jovem explorador urbano já passou por dezenas de sítios abandonados, contudo, não consegue escolher um favorito. “Acho que todos os locais me marcam, cada um de uma forma diferente, seja pela exploração em si, pelas peripécias que ocorrem, ou mesmo pelo próprio ambiente. Quando me perguntam qual é o meu sítio de eleição, fico sem resposta.”
Mesmo assim, consegue definir quais os seus sítios favoritos: “Adoro locais que, por mais anos de abandono que tenham, possuam ainda todas as memórias de quem os habitou, muitas vezes intactas, tanto em pequenas casas como em grandes palacetes. Contudo, há locais que mesmo estando vazios têm uma arquitetura com detalhes incríveis e únicos que conseguem proporcionar uma exploração tão boa como as referidas ‘cápsulas do tempo’.”
Dentro destes espaços perdidos na memória, os objetos que mais gosta de encontrar são “fotos, ainda a preto e branco, dos antigos proprietários.” Por vezes, encontra também pianos antigos. “Já tenho também encontrado coisas menos comuns: armas, microscópios, morgues ou objetos mais invulgares que, muitas vezes, acabam por servir para dar nome aos locais.”
Ainda mais raro do que armas e pianos antigos são espíritos mas Daniel Pereira assegura que também já os encontrou: “a coisa mais surpreendente com que me deparei num sítio foi uma manifestação bem visível e gravada em vídeo de uma presença numa antiga casa abandonada, isolada no meio do campo, de noite, sob a forma de energia, chamada por muitos de ‘orb’, apesar de apenas me ter apercebido dela durante a edição do vídeo”, recorda-se.
Tal como em muitos outros aspetos da vida, a pandemia da Covid-19 veio mudar a forma como os exploradores urbanos participam nesta atividade. Daniel Pereira explica que, devido às regras impostas na altura, ficava apenas por zonas perto de casa e até onde se conseguisse deslocar facilmente. O tempo que já podia dedicar a explorar sítios abandonados foi usado para editar fotografias e vídeos que tinha deixado em stand-by.
Antes de terminarmos a nossa conversa, o jovem explorador urbano de 17 anos deixa-nos alguns conselhos, dedicados especialmente àqueles que pensam começar a entrar nesta subcultura. A principal dica é prestar atenção aos sítios que nos rodeiam porque em muitos deles há beleza desconhecida. “Às vezes, os melhores locais estão mesmo à nossa frente e ainda assim passam despercebidos à maior parte das pessoas.”
Em termos de segurança, explica que temos de ter cuidado. “Por vezes é preciso correr riscos para ter uma boa foto e no urbex esses riscos não são poucos mas o facto de se ver bem o chão que se pisa ou mesmo a estrutura dos locais pode ajudar a minimizar acidentes mas já não seria a primeira vez que alguém se metia pelo chão adentro”, alerta. E acrescenta: “procurar fazer isto em grupo ou com o conhecimento de mais alguém também é útil, já que caso algo corra menos bem, uma pessoa não fica desaparecida sozinha.”