Na cidade

Saúde mental, extremismos e medo da ciência — as grandes tendências para 2022

A trendspotter Marian Salzman explica quais são os pontos cruciais para o próximo ano e relembra que devemos manter os cintos de segurança apertados.
Marian Salzman

A pandemia, as alterações climáticas e as desigualdades sociais são os três fatores que vão impactar todas as vertentes da vida da população em 2022. Se em 2019, ainda sem conhecimento de que uma pandemia se avizinhava, a trendspotter Marian Salzman previa que 2020 seria um ano de “caos” e de um “novo normal”, a incerteza é agora a grande constante. “A única certeza que permanece é a incerteza”.

De todas as tendências que emergem, a que mais surpreendeu a vice-presidente para a área de comunicação da Philip Morris International (PMI) foi a conversa aberta à volta da saúde mental. “Antes não queríamos ouvir a resposta à simples pergunta como estás, e agora preocupamo-nos realmente com o bem-estar dos outros”, afirmou no webinar online, realizado a 7 de dezembro, em que revelou as 22 tendências sociais para o próximo ano. As ferramentas, como meditação ou um psicólogo, tornaram-se essenciais para lidar com outras tendências que já se manifestaram, como o caos em que vivemos e que não podemos controlar ou, no caso específico dos mais jovens, a ansiedade deste “novo normal”, em que a maioria não tem perspetivas de ter uma vida melhor do que a dos seus pais ou avós. Estes novos sentimentos generalizados vão levar a outra das tendências, os extremismos. 

Apesar de uma maior noção para o tema, a tolerância não se generalizou. Os discursos de ódio têm-se intensificado num mundo onde o centro parece cada vez mais apagado. “A moderação parece ter passado de moda. A maioria das pessoas não se situa nos extremos, está no meio, mas não são essas pessoas que são ouvidas”, alerta Salzman, de 62 anos. As desigualdades são um promotor desta polarização, num mundo onde “estamos todos na mesma tempestade, mas não no mesmo barco”, como afirmou o jornal americano “Financial Times”. 

O extremismo também se torna visível perante a ciência. Se a pandemia nos fez admirá-la — com a criação de vacinas em tempo recorde —, também nos fez temê-la. A comunicação baseada em factos simples de entender é um ponto essencial que Salzman salienta para evitar mais exemplos de caos. Das redes sociais às possibilidades infinitas da manipulação dos genes, há preocupações crescentes que têm ser seriamente discutidas e reguladas. 

Empregos, relações e cidades em mudança

Marian Salzman deixou ainda um alerta sobre os novos modelos de trabalho que demonstraram ter tanto impacto na saúde mental dos funcionários. “Se não forem dadas possibilidades de modelos híbridos, as pessoas vão procurar outro emprego onde isso seja possível”.

Aliás, isto já aconteceu este ano nos Estados Unidos, quando, em agosto, 2,9 por cento da força trabalhadora desistiu dos seus trabalhos — a “The Great Resignation”, como ficou conhecida, juntou aqueles que descobriram novas formas de trabalhar e não quiseram abdicar desses benefícios aos que, por fazerem parte de áreas onde nunca puderam deixar de comparecer, decidiram despedir-se e mudar de trabalho para poderem estar mais perto ou mais tempo em casa. 

Esta vai ser mesmo uma tendência — a casa e o bairro onde vivemos vão passar a ser centrais na nossa vida. Se muitos aproveitaram a pandemia para se mudar para zonas mais afastadas dos centros urbanos, 56,2 por cento da população mundial continua a viver nas grandes cidades e a representante da PMI acredita que as pessoas no geral não vão mudar. Serão as cidades em si que se vão adaptar. Mais espaços verdes, todos os serviços essenciais, como escolas e hospitais, numa distância a pé de 15 minutos, menos carros e com uma relação mais próxima com os vizinhos e comércio local são algumas das medidas que já estão a crescer. As tão afamadas “smart cities” vêm responder aos problemas de deslocação e bem-estar dos habitantes, mas também tornar as cidades mais eficiente, numa tentativa de controlar o que for possível tendo em conta as alterações climáticas. A escassez de água é outro problema crescente que Salzman destaca como tendência para 2022. Este é mesmo uma questão que lhe é próxima, uma vez que vive em Tucson, no Arizona, um dos estados mais afetados pela falta deste bem essencial. 

O mundo virtual e digital é outro avanço incontornável da sociedade, com o crescimento de pagamentos online, relações pelas redes sociais ou até a compra de uma obra de arte que só existe virtualmente. A tecnologia trouxe inúmeros avanços mas também nos retirou outras experiências que eram comuns. Em tempo de pandemia, foi uma boia de salvação que permitiu que todos continuassem a trabalhar e a ir à escola sem sair de casa, mas com o advento de um regresso à normalidade, será que as pessoas querem voltar a sair? Para a especialista em tendências, ter um ecrã a mediar relações ainda é uma vantagem muito valorizada. “Precisamos da segurança dada por um ecrã. E isso vai continuar, com o ecrã a ser encarado como um espaço seguro”.

Menos otimista do que no final de 2020, Marian Salzman deixa na mesma uma mensagem com expetativa para o futuro: “Esperamos que esta nova viagem não seja tão acidentada quanto a do ano anterior, no entanto, os passageiros inteligentes não irão tirar os seus cintos de segurança.”

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