Uma máquina de lavar roupa instalada no telhado de um prédio abandonado na autoestrada da A2, uma esplanada debaixo de uma ponte entre Setúbal e Palmela, uma chaleira num viaduto em Lisboa, uma torradeira no topo do Fórum Municipal Luísa Todi e estátuas de homens à escala real foram colocados nos últimos meses em várias zonas da cidade de Setúbal. Nas últimas semanas, as obras insólitas começaram também a invadir a cidade de Lisboa.
Assim que a primeira máquina de lavar cor-de-rosa foi instalada, no final de setembro de 2020, começaram a ser partilhadas várias imagens nas redes sociais, com mensagens de espanto e muita curiosidade. Afinal de contas, quem teria sido o autor da obra e como é que uma coisa daquele tamanho tinha ido ali parar sem que ninguém desse por isso?
Pois bem, as dúvidas ficaram desfeitas ou, pelo menos, parte delas quando o artista Superlinox criou a sua conta de Instagram e publicou uma fotografia da instalação artística. Apesar de ter assumido o pseudónimo, o artista não revelou pormenores sobre a sua identidade e, tal como Banksy, mantém-se no anonimato.
Por isso, a New in Setúbal foi à procura desta personagem da cultura setubalense e conta-lhe tudo que conseguiu descobrir. Superlinox nasceu em Setúbal e cresceu no universo do graffiti e da arte urbana. Depois de acabar o curso de Artes na Escola Secundária Dom Manuel Martins, em Setúbal, entrou na licenciatura em Belas Artes, na vertente de Escultura, na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa.
“Quando terminei o curso cheguei a ser o artista dito convencional — criei obras e fiz o meu portefólio, tal como os outros colegas. No entanto, achei que não seria esse o meu caminho e o projeto do Superlinox surge da vontade de criar uma verdade entre o autor e a sua obra. No fundo, o que pretendo fazer é poesia através da arte e, com isso, divertir as pessoas e suscitar o diálogo,” conta em entrevista exclusiva à New in Setúbal.
Superlinox, a personagem
Segundo o artista, apesar de a máquina de lavar ter surgido em 2020, o seu alter-ego artístico não “surge do zero, mas de um acumular de experiências de vários anos”. À NiS, explica que quando começou a pensar no projeto percebeu que não poderia assinar as obras com o seu nome verdadeiro — iria usar um pseudónimo que expressasse a sua identidade enquanto artista anónimo.
“Costumava jogar online com um amigo e fazíamos imensas noitadas. A certa altura, não sei muito bem porquê, começou a chamar-me Linox. No entanto, achei que era demasiado abstrato e, por isso, juntei-lhe uma carga conceptual porque na verdade quero ser um super artista”, revela.
Tanto os objetos com as estátuas, todos pintados com tinta em spray, não têm uma única interpretação. Por exemplo, a esplanada amarela colocada depois da máquina de lavar, pode servir para vários cenários.
“A esplanada é uma instalação com uma mesa e duas cadeiras vazias. Apesar de estarem vazias, podemos imaginar que estão lá pessoas sentadas a beber limoncello e a partilhar um momento de conversa, como por exemplo, duas amigas, um pai um filho ou até dois amantes”, diz.
Se leu o artigo até aqui, deve estar a perguntar como é que o artista monta as peças sem ser apanhado. A resposta é simples: as horas escolhidas para colocar os objetos dependem da zona. De facto, o ideal seria nunca visto por ninguém, mas nem sempre isso é possível.
“Cada instalação é uma aventura para mim, mas confesso que até agora, a mais desafiante foi colocar a chaleira no viaduto a caminho do Ikea. Tenho medo de alturas e aí tive mesmo de me superar. Para chegar lá acima, tive de subir umas escadas, rastejar numa barra de ferro durante dez metros para a frente e outros dez metros para trás durante a noite. Foi um momento de pura adrenalina. No caso da máquina de lavar, roupa foram precisas cinco pessoas e uma corda de 12 metros”, recorda.
Depois dos objetos, apareceram as estátuas: o Joel, o Manuel e o Ricardo. O Manuel, pintado de amarelo, foi colocado na zona industrial da Mitrena e é uma homenagem ao pai de Superlinox, antigo operário fabril, mas também a todos os pais da classe operária. Está vestido com a farda de trabalho do progenitor do artista, com as suas botas de biqueira de aço calçadas, a caneta e o relógio Casio.
No Dia do Trabalhador, a 1 de maio, foi deitado abaixo. “Assim que soube que o Manuel tinha sido derrubado, o meu impulso foi ir lá levantá-lo, mas depois quando o vi no chão, achei que era simbólico — um operário caído, que é claramente uma questão política”.
O Ricardo, um jovem estudante, colocado na Escola Secundária Dom Manuel Martins, também teve um boom nas redes sociais, tal como Joel, o “bom rebelde”, instalado por cima das letras de Setúbal, junto à rotunda do Alegro Setúbal.
Peças roubadas, com exceção da ventoinha
A maioria dos objetos usados nas criações artísticas mantiveram-se nos locais poucas horas ou dias. Para Superlinox, a questão da efemeridade é algo que existe em teoria. “Assim que faço uma instalação, tenho consciência de que os objetos não vão durar muito e entro automaticamente numa contagem decrescente. Ainda assim, confesso que fico chateado quando as peças desaparecem”, admite.
Apesar de ter nascido em Setúbal, Superlinox já não mora na cidade há vários anos. No entanto, considerou que fazia sentido começar o projeto cá e promete continuar a surpreender todos com mais objetos e esculturas colocadas em sítios insólitos. Nas últimas semanas, muitos têm reparado nas obras crescentes agora na cidade de Lisboa.
“Monólito VII”, 2021(da série “Uma Odisseia na Rua”)Tinta spray (chiclete) s/ máquina de lavar83 x 59,3 x 49,5…
Posted by Super Linox on Friday, November 19, 2021