Na cidade

Rural Move: a associação que leva os portugueses a mudarem-se para o interior

Não tem fins lucrativos e nasceu durante a pandemia. O objetivo é mudar o Pais, enquanto deixa as famílias mais felizes.
Vai ajudá-lo em tudo.

João Almeida tem 27 anos e nasceu numa aldeia que tem, neste momento, 10 habitantes: Vilar de Baixo, no distrito de Viseu. Assim como tantos outros jovens, saiu da aldeia que o viu nascer e mudou-se para a cidade de Aveiro para continuar os estudos. Está a fazer um doutoramento na área de empreendedorismo nas zonas rurais e co-fundou, na altura da pandemia, a Rural Move, uma associação sem fins lucrativos que quer incentivar pessoas a mudarem-se para o interior do País.

Quando o mundo entrou em confinamento devido à Covid-19, surgiu a Tech4Covid19, uma espécie de associação de startups e empresas de tecnologia que se juntaram para criar ferramentas úteis para a luta contra a doença. Criaram, por exemplo, a aplicação Posso Ir?, que dizia as melhores horas para ir à praia, supermercados e farmácias durante a pandemia. Foi também nesta comunidade tecnológica que surgiram outros projetos, não só a pensar nos dias em que estávamos confinados, mas também no pós-pandemia.

“Faço parte do grupo de pessoas que se juntaram a esse movimento para resolver problemas na pandemia e um dos fundadores lançou a ideia de fazer alguma coisa pelos territórios rurais”, conta à NiT João Almeida, o presidente da Rural Move. Pouco depois, foi criado um grupo para discutir o projeto e juntaram-se cerca de 10 pessoas às sessões online. Na altura, ainda não havia nenhuma ideia concreta sobre o que poderiam fazer.

Entre sessões e trocas de opiniões, começaram a tentar identificar os problemas e as oportunidades que existem nos territórios rurais — e rapidamente chegou a questão do trabalho remoto, que estava a ganhar destaque e interesse devido à pandemia. Se há quem se mude para as grandes cidades por existir uma maior oferta de trabalho presencial, porque é que as pessoas que trabalham remotamente não se podem mudar para uma zona rural, no interior do País?

Com base nesta premissa, nasceu assim a Rural Move, em outubro de 2020. “Primeiro começámos por criar uma plataforma que agrega informação para todas as pessoas que se queiram mudar, temporariamente ou não, para um território rural. Durante a pandemia houve muitas pessoas interessadas”, revela. É nesta plataforma que podem aceder às informações sobre os municípios do interior, espaços de trabalho, alojamento e oportunidades de emprego.

Atualmente, a associação conta com cerca de 30 voluntários que, apesar de não se conhecerem anteriormente, tinham uma história em comum: ou vivem em territórios rurais ou nasceram lá mas tiveram de se mudar. Um deles, por exemplo, mudou-se de Berlim para Mação há cerca de quatro anos.

Mais do que incentivar esta mudança, a associação sem fins lucrativos queria fazer parte de todo o processo. “Começámos a perceber que, como movimento nacional, faltava-nos algum trabalho no terreno. Não queríamos estar a ajudar alguém de Lisboa a mudar-se para outro território se não tivéssemos lá um parceiro, então começámos a olhar mais para as comunidades locais”, sublinha. 

Afinal de contas, não valia a pena fazer campanhas de atrações para Trás-os-Montes, por exemplo, se as comunidades locais não estivessem preparadas para receber e integrar as pessoas. Foi assim que a Rural Move começou a trabalhar nos dois sentidos, “tanto na parte da integração de envolvimento das comunidades como no apoio a quem se quer mudar”.

O objetivo é, na verdade, bastante simples: promover a sustentabilidade a todos os níveis nestes territórios que estão a perder, cada vez mais, os seus habitantes. “Todos estes problemas que andamos a ouvir há décadas podem ser minimizados se houver pessoas a utilizar os territórios”, garante João Almeida. Por outro lado, a qualidade de vida também é melhor e os trabalhadores conseguem ter um maior equilíbrio entre a vida profissional e pessoal.

“Acreditamos que as pessoas podem ter as mesmas oportunidades que no território urbano, tanto na educação como no trabalho, se considerarmos estas opções remotas. Queremos desmistificar a ideia de que é preciso viver nas grandes cidades.” Neste momento, a Rural Move tem parceria com oito municípios e está presente em mais de 30 territórios, sobretudo em regiões no norte e centro. Em todos eles, têm um parceiro institucional ou uma pessoa que vive lá e faz essa ponte.

“Quando alguém me diz que quer ir para Melgaço ou Fundão, temos sempre lá alguém que pode dar apoio nesse processo de mudança. Existem muitos mecanismos, mas o que falta muitas vezes e o que faz a diferença neste processo é o apoio inicial”, sublinha. Apesar de não saber o número ao certo de quantas pessoas se mudaram para o interior desde a criação da associação, já ajudaram mais de 100 pessoas só com estes apoios “informais”. 

Além da plataforma, que reúne informações e novidades sobre as localidades rurais e permite conhecer, em questão de segundos e a qualquer hora, os alojamentos, espaços de coworking e oportunidades de emprego, a Rural Move tem organizado várias iniciativas para incentivar ainda mais esta mudança.

Uma delas, a Rural Experience, aconteceu no início de janeiro, em Miranda do Douro: durante uma semana, levaram 15 trabalhadores remotos à região de Trás-os-Montes, onde trabalharam em vários pontos do concelho das 8 às 17 horas, visitaram vários locais e, ao final do dia, conviviam em jantares comunitários.

“As pessoas puderam experimentar e o próprio município conseguiu ter ideia de como é receber este tipo de público”, diz. Agora, pretendem entrar em contacto com outras autarquias para fazerem atividades similares com o objetivo de levar estes grupos de trabalhadores remotos a experimentar vários territórios durante uma semana ou, quem sabe, até mais tempo.

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