De quantos ângulos é possível ficar-se emocionado com uma paisagem? Fazer turismo na própria cidade (no caso, o Porto, claro) traz consigo alguns desafios muito próprios. Um deles é o de sermos capazes de nos desprendermos, de nos podermos maravilhar com as vistas para as quais já perdemos toda a sensibilidade.
Há, ainda assim, formas de contornar este problema. Dir-se-ia que, pela localização, atravancado entre os velhos edifícios e armazéns do Cais de Gaia, o Hilton Porto Gaia dificilmente teria uma vista privilegiada sobre a paisagem. Mas é ali, num dos pisos superiores, que se esconde o Magma e o seu recanto — mais secreto para os locais do que propriamente para os que nos visitam.
Entre cocktails de assinatura, os velhos clássicos e vinhos, a conversa faz-se ao som de música ao vivo, seja uma eletrónica que pauta o ritmo de forma suave ou, em certas ocasiões, mesmo jazz ou blues.
Aberto desde 2021, tornou-se no segundo Hilton do País — o primeiro mora em Vilamoura — e chegou à cidade como um dos espaços com mais quartos, um total de 194. E é precisamente no tamanho, ou na forma como se joga com ele, que parece estar o segredo do hotel.
Há quem não prescinda da pacatez dos pequenos hotéis boutique, mas há também quem desgoste conviver em espaços tão pequenos e prefira a capacidade de passar despercebido que estes espaços mais dimensionados oferecem. Depois, há toda uma série de questões que a unidade do Hilton trabalha bem.
Desde logo, à distância de um par de metros da margem do Douro, no Cais de Gaia, dá-lhe a localização privilegiada de que precisa. E quem o vê por fora, dificilmente é capaz de fazer as contas aos perto de 200 quartos. O hall de entrada grandioso, assente num design sóbrio de Nini Andrade da Silva, estabelece o padrão pelo qual tudo se desenvolve.
Tudo ali é amplo, espaçoso, dos corredores aos quartos, com divisões bem marcadas — sobretudo nas suites —, ao spa subterrâneo que aposta nos tons grenás que remetem para o vinho. E embora a decoração seja menos exuberante nos quartos — onde podia, de resto, apostar um visual mais arrojado e marcante —, mais do que compensa com áreas e conforto. Nota especial para o colchão — sabemos bem quão difícil é encontrar um perfeito nos hotéis — e para a sombria e super confortável casa de banho e o seu duche onde caberia uma equipa de futsal.
E se até aqui, a dimensão não representou qualquer percalço, o mesmo não se pode dizer das incursões ao spa ou ao buffet de pequeno-almoço. É bem verdade que as piscinas e a sala de refeições são enormes, mas é complicado encontrar um espaço recatado num domingo de calor em pleno pico da época alta de agosto.
O que se perde com esta convivência num hotel com quase 200 quartos, ganha-se na variedade, seja do buffet de pequeno-almoço ou nos espaçosos serviços de massagens, ou salas de turco, sauna e na piscina interior. Será, no entanto, difícil encontrar o relaxamento mental a que um spa convida, pelo menos nestes horários mais movimentados.
Dir-se-ia que o oposto acontece no ComPosto, o amplo restaurante do piso térreo, onde decorrem também os pequenos-almoços e onde o ambiente quente e acolhedor não se deixa esbater pelo enorme pé direito. Decoração simples, eficaz, de traços modernos e uma carta que aposta menos em malabarismos e mais em sabores certeiros.
É o caso de um feijão-verde em tempura, leve, limpo e crocante como se exige, que antecipam uma salada de bacalhau no ponto, para fechar a fase introdutória do menu de degustação. Segue-se um polvo assado — onde a matéria-prima traiu o chef, com uma textura um tanto ou quanto rija — com um bem apurado molho romesco, numa parceria que raramente falha; e um bom entrecôte maturado com molho bearnês. Uma refeição de doses bem fartas, fechada com os sabores tropicais bem equilibrados do abacaxi assado — tudo bem seguro com um pairing certeiro praticamente só com vinhos do Douro, exceção feita a um Pinot Noir da costa vicentina.
Ao fim de dois anos, há ainda algumas arestas por limar neste hotel com a assinatura Hilton, nomeadamente na carta de jantar que se pretende, se não mais criativa — nem sempre é necessário reinventar a roda — pelo menos, cumpridora naqueles que são os bons exemplos dos sabores e acima de tudo das matérias-primas que fazem de nós portugueses orgulhosos da nossa herança gastronómica.
Certo é que não há muito que enganar: quem preferir destinos de maior recato, talvez possa encontrar o local ideal noutro sítio. Quem não dispensa ambientes modernos, espaçosos, e o habitual serviço diligente, não terá muito por onde se enganar.
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