De mota ou de carro, pouco importa: há uma estrada na Suíça que todos devem percorrer pelo menos uma vez na vida. Isto se não tiverem medo de curvas, claro. Chama-se Tremola Road, é um dos troços mais altos (e desafiantes) de toda a Europa e um dos percursos que pode fazer para chegar ao Gotthard Pass, uma passagem de montanha dos Alpes Suíços, que liga a Suíça de língua alemã à de língua italiana — e fica a 2.106 metros acima do nível do mar.
Durante décadas, o Gotthard Pass era a única ligação entre Uri, no norte, e Ticino, no sul dos Alpes. Ainda hoje, é a ligação mais direta entre Zurique e Lugano, assim como entre algumas regiões da Alemanha e de Itália. O caminho até ao cume estende-se por 64 quilómetros entre Andermatt e a vila de Biasca e uma das formas de chegar lá é através da sinuosa estrada nas encostas do Vale Tremola.
Com 11 quilómetros de extensão, o percurso em calçada tem um desnível de 300 metros, com uma estrada que desenha ziguezagues vertiginosos. Para sermos mais precisos, o “monumento rodoviário mais longo da Suíça” tem 37 curvas, sendo que 24 delas são fechadas. O troço, que faz a ligação entre Airolo e o Gotthard Pass, tem entre seis a sete metros de largura e ainda conserva algumas partes de antigos muros de pedra.
Desde o século XIII que os viajantes que cruzavam o Gotthard passavam pelo vale Tremola e, por volta de 1830, as antigas pistas foram substituídas por uma rua mais apta para a época — foi então que nasceu a estrada de Tremola, construída entre 1827 e 1821 pelo engenheiro Francesco Meschini. Depois da Segunda Guerra Mundial, tornou-se evidente que o velho e sinuoso caminho estava cada vez menos capaz de atender às novas exigências e, em 1951, foi inaugurada outra estrada mais moderna — a que conhecemos hoje em dia.
Atualmente, milhares de turistas chegam à Suíça com o propósito de percorrer esta subida, com uma inclinação média de 7,4 por cento e 37 curvas — cada uma delas tem um nome na língua local. A última antes de chegar ao cume, por exemplo, chama-se “Sass dét Suaróf”, em homenagem ao general russo Alexander Suworow, que atravessou o antigo trilho com o seu exército, em setembro de 1799.

Este não é, contudo, o único percurso que o vai deixar de boca aberta quando atravessar o maciço montanhoso de Gotthard. A história deste passo remonta ao século XIII, quando foi construída uma ponte pelo governo local sobre o desfiladeiro Schöllenen no norte da montanha (que era considerado intransitável) e a nascente do rio Reuss. Essa construção, hoje conhecida como “Ponte do Diabo”, deu origem a uma lenda.
De acordo com a narrativa fantasiosa, foi tão difícil construir uma ponte naquele local que um pastor suíço, desesperado, pediu ao diabo que a construísse. O diabo apareceu e ofereceu-se para construir a ponte, na condição de que receberia em troca a alma dos primeiros suíços que a cruzassem. Depois da estrutura ter sido construída, os aldeões (que eram mais inteligentes que o diabo) enviaram uma cabra para o enganar. Irritado com o truque, o demónio pegou numa grande pedra com o objetivo de destruir a ponte, mas apareceu uma mulher idosa pelo caminho com um crucifixo — a fraqueza do diabo — que o assustou. Assim, largou a pedra, fugiu, e a ponte continua por lá.
Isto, claro, não passa de lendas, mas a verdade é que a ponte na pequena vila de Göschenen é bastante assustadora por ficar a uma altura de 1.100 metros. Contudo, foi esta ponte sobre o Reuss que permitiu abrir toda a rota do Gotthard. Mais tarde, trocaram a estrutura de madeira por uma de pedra, que ainda se mantém por lá — e pode visitá-la a pé. Com o som do rio e a vista para o penhasco do outro lado, todo o cenário é impressionante.
Depois, em 1882, foi inaugurado o primeiro túnel da Gothard Railway, com 15 quilómetros de extensão e comboios especiais que circulavam entre Milão e Lucerna. Já em 1963, o parlamento suíço decidiu construir um túnel rodoviário que passa por dentro da montanha para dar resposta ao aumento constante do trânsito nesta região dos Alpes. Com 16,4 quilómetros de comprimento, foi, até 1980, o túnel rodoviário mais longo em funcionamento. Hoje em dia, ocupa a nona posição.
As construções não terminam por aqui. Em junho de 2016, foi inaugurado o túnel ferroviária de alta velocidade: o Gotthard Rail Link, que demorou 17 anos a ser construído e contou com a ajuda de mais de 2.600 trabalhadores. O túnel estende-se ao longo de 57 quilómetros — mais do que a distância entre Lisboa e Setúbal —, tem 9,5 metros de diâmetro e 2.300 metros de profundidade. É considerado uma verdadeira obra-prima da engenharia.
Esta rota foi, durante muito tempo, considerada a mais inovadora dos Alpes Suíços. A ponte, a ferrovia de montanha do século XIX, o túnel rodoviário e a obra com 57 quilómetros de comprimento são conquistas impressionantes — e tudo começou há 800 anos.
Como lá chegar
Como não existe aeroporto em Airolo, onde começa a estrada sinuosa cheia de curvas, o melhor é apanhar voo até Milão, em Itália. Com partida de Lisboa, encontra bilhetes de ida e volta desde 67€.
Como o objetivo é fazer o percurso de carro, o melhor é alugar um automóvel mesmo no aeroporto. A viagem de Milão a Airolo demora cerca de 1h40.
De seguida, carregue na galeria para conhecer a tão famosa estrada cheia de curvas.