Pode parecer impossível, mas há quem consiga encontrar arte nos locais mais negros. É assim a história de Ivanka Siolkowsky, que chegou a Bucha para fazer voluntariado junto da população depois de a cidade ucraniana ter sido arrasada pelo exército russo desde a invasão, a 24 de fevereiro. No entanto, acabou por se tornar numa inspiração para milhares de pessoas. Daquele país e de vários outros.
Nos subúrbios de Bucha, Sasha conheceu um homem que tinha perdido tudo na guerra. A casa fora bombardeada e incendiada, e o filho assassinado. “Não há nenhuma alegria nesta cidade para mim”, disse à mulher de 39 anos.
Apesar da dor, aquele sobrevivente inspirou Ivanka Siolkowsky a trazer uma mudança a Bucha. “As palavras dele partiram-me o coração”, contou ao jornal americano “The Washington Post”.
Desde que se tornou mãe que as flores favoritas de Sasha são os narcisos. Por isso mesmo, Siolkowsky pegou em tintas e pincéis e começou a transformar as ruínas de Bucha. Os buracos de bala nas paredes passarem a ser desenhos de flores, “para continuar o trabalho que a natureza começou.”
Contudo, após 27 dias de controlo da cidade por parte dos russos — que queimaram casas e mataram e violaram civis —, Ivanka temia que a sua arte pudesse não ser bem-recebida pelos habitantes locais. “Eu tinha medo sempre que alguém caminhava até mim”.
Não podia estar mais enganada. À medida que as flores iam surgindo, chegavam também mais pessoas, que a rodeavam para assistir de perto às pinturas. Aos poucos, os sobreviventes da cidade também começaram a querer participar. Aliás, uma das principais ajudantes de Siolkowsky tinha apenas quatro anos. “Dei-lhe um pincel e ela ajudou com algumas flores. Quando os vizinhos viram Anya a ajudar, começaram a pedir para que eu pintasse o seu portão também.”
Ivanka Siolkowsky came to Ukraine from Toronto to help turn destruction back into life – she’s been painting flowers on fences in Bucha that were shot at by the Russian army. pic.twitter.com/S3HHZHozOm
— Anastasiia Lapatina (@lapatina_) May 16, 2022
Graças a estas pinturas originais, nasceram jardins com narcisos, margaridas, papoilas vermelhas, malmequeres e, claro, girassóis — o símbolo da esperança e resistência ucraniana — em Bucha. “Realmente deveria ter tirado uma foto ou algo para ter como referência, já que as primeiras flores que pintei não pareciam nada narcisos”. E acrescenta: “Mas melhorei a cada buraco de bala, e havia muitos.”
Não tardou até o trabalho de Ivanka Siolkowsky — que nasceu no Canadá e que viajou para a Ucrânia de propósito para ajudar aquela população durante a guerra — fosse reconhecido e aplaudido nas redes sociais. Uma fotografia com as suas obras de arte já tem mais de 15 mil gostos, e uma onda avassaladora de comentários positivos. “Estes pequenas atitudes de humanidade e simpatia são muito importantes. Obrigado, Ivanka”, diz um dos seguidores.
Ainda assim, não é o reconhecimento e os elogios que a deixam mais emocionada. “Isto nunca foi sobre criar obras de arte. É sobre trazer imagens de alegria de volta para esta cidade”.
Apesar de ter conseguido trazer mais cor à cidade destruída, Ivanka diz que vai ter de voltar para Toronto, no Canadá, onde trabalha como consultora de produtividade. Garante, porém, que planeia regressar à Ucrânia no verão.
“A minha esperança é que aquelas pessoas em todas as cidades ocupadas pintem flores nos seus portões. As pessoas querem superar a dor e estão a fazer o que for preciso”.